26 de nov. de 2015

POEMAS DO COTIDIANO



Canto triste


(martin van maele)


É a hora da poesia.
Como se precisasse de hora
a musa esquálida,
batendo, embora,
no peito inerme em busca
sabe-se lá de quê.
Não há rima a saltar do fim,
não há verso a pular indômito.
Tudo vem em quase-vômito,
arrancando a dor que cultivo em mim.
Ah! louco o poeta a gemer em si.
Ah! prazer agônico de pensar em ti.
Esquálida/pálida/cálida musa
que não percebe que se inscreve
em cada sílaba a dor que usa
fazer de mim o escravo inútil
do canto triste quanto fútil.

25.6.95

POEMAS DO COTIDIANO



Asa virtual



(martin van maele)


Quebrei, um dia, meus sonhos
na esquina inefável de uma rua torta.
Lá deixei o espanto
do pouco que já vivera. Corri
em busca da vida por merecer.
Achei - quase um século depois -
  apenas a dor
de uma asa
virtual.

18.6.96

23 de nov. de 2015

POEMAS DO COTIDIANO



Não queiras ser a musa





Perdoe-me, cara,
mas não queiras ser
mais do que és.
Já tens a mim e à minha vida.
Já tens meus dias, insípidos embora.
Já tens insones noites de meus sonhos vagos.
E, mais que tudo, já tens os frutos de nossa permanência.
Portanto, cara,
não queiras ser também a musa de meus versos loucos.

13.6.96

POEMAS DO COTIDIANO




Coração de vidro



(martin van maele )



Nas águas loucas
que em mim deságua
o teu desejo,
quero meu barco
 a navegar incólume
e, barqueiro incipiente,
meu coração de vidro
aos teus olhos volverá
como a buscar estrelas vivas
de caminhos  inconsequentes.


12.6.96

20 de nov. de 2015

POEMAS DO COTIDIANO



Gozo dos amantes



(martin van maele)



Fogo o que te queima
e chamas amor.
Se o que te abrasa
teima,
em que momento for,
em impor
ao teu ser a asa
que te leve ao infinito,
para o teu voo
e ouve,
ouve o teu próprio grito.
Nas chamas em que me chamas,
o teu fogo ao meu fogo então se casa,
e a dor dos longos dias de antes
fará da dor da chama o gozo dos amantes.


12.6.96

POEMAS DO COTIDIANO



Além do antes


(martin van maele) 


Exangue o corpo em queda livre
o teu beijo inspira
no alento derradeiro.
Ao abismo apenas
lentas dores o esvair-se assiste:
tudo que de ti fora,
dentro do peito,
eterno desejo
em ondas de espanto e dor
fazem do amor o outrora
além do antes.
Agora!


5.6.96

19 de nov. de 2015

POEMAS DO COTIDIANO



Cio de lua cheia





Quisera um dia
encontrar-te louca,
cadela vadia
em pleno cio de lua cheia.
Rasgar-te o peito
com minhas unhas,
beber-te o sangue
com minha sede
e fazer de ti a última vítima
do vampiro eterno a morrer de gozo.


5/6/96

POEMAS DO COTIDIANO



  
Louco esteta






(martin van maele)



Da raiz que eras,
pintaste o branco de meu muro
nas cores de um tempo mais escuro,
e cobriste o passado com as heras
que um dia em meu coração de poeta
plantei como louco esteta.

Julguei poder dominar-te
e ao teu verde-escuro sobreviver meu branco.
Ledo engano de minha falsa arte:
agora sou apenas a dor que em meu peito estanco
na luta inútil de palavras loucas,
da minha boca para tantas outras bocas.

29.6.96


18 de nov. de 2015

POEMAS DO COTIDIANO

Teu aniversário


(martin van maele)



Hoje? Ah! Meu tesouro,
em ti pensei.
Em asas meu pensamento
quisera mudar...
ou em elétricas ondas
 de rádio e tevê
para te desejar - meu tesouro -
feliz, feliz dia de teu aniversário!
Dos meus anseios, no entanto,
nada soubeste
e então, esse fato, simples fato,
contigo fez-me sonhar
- ainda mais -
como se fosse isso possível,
meu amor de sempre!


17.4.96

POEMAS DO COTIDIANO



É isso o mundo?




(martin van maele)


Caos.
É isso o mundo?
Agora ou sempre?
César esticou o império de Alexandre
e Colombo pisou a Lua num sputinik.
Napoleão à China
venceu
com a ajuda de Stálin.
Einstein associou-se
a São Tomás de Aquino
e uma grande empresa formou
para explorar o ouro de Serra Pelada.
Mas Serra Pelada escondeu seu ouro
e Buda chutou a bunda
de Marco Pólo em Veneza.
Platão - coitado - ficou a ver navios
quando os negros de todos os continentes
conquistaram Wall Street.
Voando
além da luz
a Bruxa de Pequim
detonou
a usina de Chernobyl e o terremoto do México.
Num golpe de marketing e de karatê
a macaca Chita assumiu
a presidência dos Estados Unidos da América do Norte
e prometeu,
prometeu transformar a ilha de Manhattan
num centro de inteligência de pesquisa tecnológica
no ramo da neurociência cibernética avançada.
E de repente,
sem que não o previssem
os aiatolás do Irã,
surgiu no céu o cometa Haley
para ferver de vez
o cérebro louco de vacas inglesas - inclusive as do palácio de Buckingam -
e dos cães dinamarqueses e dos pastores - alemães ou não.

Somente então surgiu
nas florestas equatoriais da Amazônia
a Eva
da nova era,
fria e assexuada,
para fundir o mundo em valores
nunca antes compartilhados nem com Deus nem com o Diabo.
Aí, sim, e só aí,
o Caos,
e somente o Caos
riscou do mundo,
de uma vez por todas,
qualquer possibilidade futura ou remota,
de retrocesso.

26.4.96

17 de nov. de 2015

POEMAS DO COTIDIANO



Teu rumo



 (martin van maele)



Cabe a ti decidir
norte e sul,
cabe a mim ter de ir
em busca de teu rumo.
Segue, pois, teu caminho
e esquece a sombra
atrás de teus passos.
Sombra, apenas, da luz que vem
dos olhos teus.



s.d

POEMAS DO COTIDIANO



Morte e vida



(martin van maele)


Julguei-te vida e eras
morte.
Julguei-te luz e eras apenas
fogo.
Julguei-te esperança e eras somente
 beco.
Julguei-te morte e abriste-me os braços
para a vida,
enfim.


23/4/86

16 de nov. de 2015

POEMAS DO COTIDIANO



A morte



(martin van maele) 


A morte
 ronda e seduz.
A morte
não ocupa lugar.
A morte imita o vento e o luar
E transforma
 o que é vida
 em luz.


23/6/96

POEMAS DO COTIDIANO



Jogo da vida



(martin van maele)



Hoje eu vi na tevê
corpos empilhados mais uma vez.
Mortos inúteis
ao fim de mais um jogo da vida.


23/4/96


15 de nov. de 2015

POEMAS DO COTIDIANO

Loucuras inúteis



(martin van maele) 



Diante da tragédia distante
fica o espanto.
Frente à tragédia emergente
solta-se o pranto.
E o homem - lobo de si -
comove o mundo com suas loucuras
inúteis.


23/4/96

POEMAS DO COTIDIANO



Trilha




(martin van maele)


Leio
no voo de tua mente
o caminho para a montanha.
E sigo a trilha
do teu coração.  


19.4.96

13 de nov. de 2015

POEMAS DO COTIDIANO


Negas o sol



(martin van maele)



Transcendes a luz da luz que em ti brilha,
ó ser etéreo em horizontes plúmbeos.
Teces mistérios de trajetórias trânsfugas
para espasmos loucos de galáxias negras.
Negas o sol por seres mais,
negas a vida por seres eterna.
E nasceste fogo para em inferno tornares
o doce amor que um dia em ti busquei.



16.4.96

POEMAS DO COTIDIANO



O inverso de mim



(martin van maele)


Busco em mim o inverso de mim,
para chegar a ti e poder amar-te.
Sou teu espelho e és meu duplo.
Sonho o teu sonho e vives minha vida.
E vivo tua vida quanto sonhas meu sonho.
Univitelinos gêmeos, xifópagos etéreos,
convivemos ambos em cada um.
Se te buscas, encontras-me,
se me busco, encontro-te.



16/4/96

12 de nov. de 2015

POEMAS DO COTIDIANO


Poemas de amor ao anoitecer



(martin van maele)



Alguém, um dia, já escreveu
poemas de amor ao anoitecer.
Alguém, um dia, já sonhou
loucos amores à luz do luar.
Alguém, um dia, já sofreu
a dor do adeus à beira do caminho.
Sempre alguém já sentiu
tudo aquilo que tu sentes e sentirás.
Portanto, meu amigo, é inútil
que eu te diga para não escreveres teus poemas
de amor.
Escreva-os. Escreva-os sempre.
Pois são sempre novos e inéditos todos os poemas
de amor.



12/4/96