sinto falta do cheiro de mato
sinto falta do cheiro do grupo escolar
sinto falta do cheiro de terra
quando cai de repente a chuva de verão
sinto falta do cheiro de café
quando escorre pelo coador de pano a água fervente
sinto falta do cheiro de fumaça
do fogão a lenha de minha mãe
sinto falta do cheiro do colchão de palha
que envolvia meus sonhos nas frias noites de lua nova
sinto falta do cheiro da manga-rosa
que o sabiá bicava e derrubava
sinto falta do cheiro das flores do manacá
que plantou um dia a minha avó no quintal lá de casa
[a avó de alvo rosto severo que não conheci]
sinto falta do cheiro do cigarro de palha de meu avô
o fumo negro em suas mãos negras cuidadosamente picado e enrolado
[o avô que uma tosse renitente obrigou a deixar de fumar aos 70 anos]
sinto cheiro do milho verde cozido em panela de ferro
- o milho que virou fubá no moinho do tempo
mas de tantos cheiros da infância
que povoam minhas lembranças
há um cheiro que me abala
há um cheiro que entontece meus sentidos
muito mais que todos os demais
- o cheiro dos braços e abraços de minha mãe
27.5.2025
(Ilustração: Amedeo Modigliani - maternité)
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