15 de mar. de 2025

melancolia de verão

 



há dias que não deviam ter amanhecido

quando a mente divaga pela manhã como se fosse noite

quando tudo quanto se quer é o silêncio de uma madrugada fria

enquanto ao redor o verão do aquecimento global

abrasa pensamentos e corações



há dias que trazem no bojo quente do verão a melancolia

de passos perdidos em noites de outrora

quando a vida era apenas o quadrado do paralelepípedo seguinte

e o frio do tempo não enregelava o peito opresso por horizontes dissolvidos

na névoa de manhãs que hoje não existem mais



não se espera da vida que seja ela sempre a manhã de bem-te-vis

não se espera entretanto que haja noite eternas

nem nuvens de tempestade que não se abram em arco-íris

ao final da tarde

– que haja amanheceres de tempos em tempos – um respiro



se não se vislumbra de vez em quando a estrela da manhã

a solidão da noite se transforma em manto de saudade

a travar os passos de novas buscas e de novos caminhos



que se peça à noite que respeite o lento mover do vento

e seja ela – a noite – o tempo do esvaziamento

para que o dia nasça sempre com o renovado ensejo da esperança




10.1.2024

(Ilustração: Berthe Morisot - Jour d'été, 1879

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