há dias que não deviam ter amanhecido
quando a mente divaga pela manhã como se fosse noite
quando tudo quanto se quer é o silêncio de uma madrugada fria
enquanto ao redor o verão do aquecimento global
abrasa pensamentos e corações
há dias que trazem no bojo quente do verão a melancolia
de passos perdidos em noites de outrora
quando a vida era apenas o quadrado do paralelepípedo seguinte
e o frio do tempo não enregelava o peito opresso por horizontes dissolvidos
na névoa de manhãs que hoje não existem mais
não se espera da vida que seja ela sempre a manhã de bem-te-vis
não se espera entretanto que haja noite eternas
nem nuvens de tempestade que não se abram em arco-íris
ao final da tarde
– que haja amanheceres de tempos em tempos – um respiro
se não se vislumbra de vez em quando a estrela da manhã
a solidão da noite se transforma em manto de saudade
a travar os passos de novas buscas e de novos caminhos
que se peça à noite que respeite o lento mover do vento
e seja ela – a noite – o tempo do esvaziamento
para que o dia nasça sempre com o renovado ensejo da esperança
10.1.2024
(Ilustração: Berthe Morisot - Jour d'été, 1879
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