A droga que injeto em minhas veias todos os dias
É a vida.
A droga que cheiro em carreiras loucas por ruas tortas
É a vida.
A droga que queimo no meu cachimbo da paz a cada hora
É a vida.
A droga que bebo de bar em bar para afastar o tédio
É a vida.
Masculiniza-me a droga da vida para os saltos e sobressaltos do mundo.
Feminiliza-me a droga da vida para os desentorpecimentos de minha mente.
Movido que sou pela droga da vida não queimo o pavio da vela pelos dois lados.
Então eu vos pergunto – oh meus irmãos de estrada – por onde caminhais?
Que estrelas do espaço sideral guia vossas vontades de sangue?
Por que vos matais a vós mesmos a cada respingo de chuva ácida?
Por que vos matais a vós mesmos nos campos de batalha?
Por que vos matais a vós mesmos em cada beco sujo por motivo fútil?
Quais são as vossas encruzilhadas e os vossos descuidados dissídios?
Não coloquemos coroa de flores no túmulo do soldado desconhecido.
Não ergamos estátuas a generais nem a pseudo-heróis de sujas batalhas.
Não cultivemos a mão armada que se ergue por fúria ou preconceito.
Abracemos a volta dos desertores e espalhemos flores atrás de seus passos.
Apenas a poderosa droga da vida corra como sangue por nossas veias.
A vida. Ah, a vida!
Celebremo-la.
Cantemo-la.
Dancemo-la.
Que se espalhem pelos caminhos os nossos risos - não as nossas lágrimas.
Que depois de cada curva não estejam a nos espreitar os espectros dos assassinos.
Que haja depois de cada pedra que machuca nossos pés um tapete de folhas verdes e botões de flores e sementes das árvores que nos darão os frutos do mais que ansiado respeito à vida.
Assim penso eu – o ingênuo poeta desses tempos de tormentos e espantos.
Assim penso eu – ó meus quase irmãos de compartilhadas crenças – como um desabafo de esperança que escreva uma nova história no palimpsesto de cada pele que cobre nossos corpos.
15.3.2024
(Ilustração: Oskar Kokoschka:Dolomite Landscape)