31 de out. de 2024

peabiru

 




correm meus olhos pela planície

correm meus olhos pelo planalto

morrem minhas pupilas na cordilheira



ouso caminhar o caminho

onde outrora

caminharam muitos outros caminheiros

e o caminheiro de agora

traz na marcha o passo do nunca mais



colho nas pegadas da onça

esse tempo imenso que roça as pedras pontiagudas

[o tempo – bastardo filho do movimento –]

não sacia meu desejo de imanência

pelas trilhas que sobem montanhas

pelas trilhas que almejam o mar



caminha o andino faminto

caminha o tupinambá sem destino

longas são as trilhas do mar

estreitas as trilhas da cordilheira

levam todas – essas trilhas sem destino –

ao só destino de caminhar



se corro os olhos pelas planícies

minhas pupilas miram nevados picos

se corro os olhos pelos planaltos

minhas pupilas sonham com o sal do mar



e o mar que buscam os caminheiros

nem sempre salga a carne que comerciam

e a montanha

a que nem sempre chegam pés descalços

oferece ao caminheiro só o tempo de sonhar



o tempo – filho de prótons e planetas –

que consome as vidas e consome os pés

dos caminheiros de antanho e de agora

não guarda histórias nem guarda marcas

guarda mesmo só o destino de caminhar



23.6.2023

(Ilustração: índios no caminho do Peabiru; 
desenho de autoria não identificada)

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