correm meus olhos pela planície
correm meus olhos pelo planalto
morrem minhas pupilas na cordilheira
ouso caminhar o caminho
onde outrora
caminharam muitos outros caminheiros
e o caminheiro de agora
traz na marcha o passo do nunca mais
colho nas pegadas da onça
esse tempo imenso que roça as pedras pontiagudas
[o tempo – bastardo filho do movimento –]
não sacia meu desejo de imanência
pelas trilhas que sobem montanhas
pelas trilhas que almejam o mar
caminha o andino faminto
caminha o tupinambá sem destino
longas são as trilhas do mar
estreitas as trilhas da cordilheira
levam todas – essas trilhas sem destino –
ao só destino de caminhar
se corro os olhos pelas planícies
minhas pupilas miram nevados picos
se corro os olhos pelos planaltos
minhas pupilas sonham com o sal do mar
e o mar que buscam os caminheiros
nem sempre salga a carne que comerciam
e a montanha
a que nem sempre chegam pés descalços
oferece ao caminheiro só o tempo de sonhar
o tempo – filho de prótons e planetas –
que consome as vidas e consome os pés
dos caminheiros de antanho e de agora
não guarda histórias nem guarda marcas
guarda mesmo só o destino de caminhar
23.6.2023
(Ilustração: índios no caminho do Peabiru;
desenho de autoria não identificada)
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