17 de nov. de 2017

o relógio








havia um relógio de parede na casa da minha tia

seu pêndulo monótono marcava os dias rápidos

da minha meninice

mas eu não sabia disso



na sala de móveis antigos

a mesa e as cadeiras compunham um cenário

de decadência e velhice

mas eu não sabia disso



o relógio de pêndulo monotonamente marcava

as horas fugazes da minha juventude

como um profeta de Poe sobre as sombras da noite

mas eu ainda não conhecia o Poe



o relógio da sala de jantar da casa velha da minha tia

marcava no seu monótono tiquetaquear

as horas felizes e fugazes da minha vida ali

mas eu nem desconfiava dessa fugacidade



as horas monótonas que o relógio de parede da casa da minha tia

marcavam no seu lento vai e vem

eram horas que não sabia que

iriam se acabar assim tão depressa



na janela da casa vizinha a minha amada não acendia a luz

e eu esperava inutilmente que as horas passassem

e as horas passaram tão fugazes como as fases da lua

mas eu nunca consegui saber nada disso



aquelas noites em que o relógio de parede da casa da minha tia

marcaram finalmente a meia noite eu só acordei

sessenta e dois anos depois

e mesmo hoje eu ainda nada sei da fugacidade do tempo

e só sei que um relógio de pêndulo da sala de jantar

da casa da minha tia foi um dia o movimento perpétuo

de um tempo que voou nas asas do corvo

espantado pelo toque da meia noite do relógio da casa da minha tia

voou do meu peito

voou da minha vida

ela a minha namorada que foi embora

não voltou jamais

e o tempo daquele relógio não volta

não volta mais

nunca mais

nunca

não


14.2.2017



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