12 de dez. de 2017

sei o que escrevo


(Albert Marquet -French, 1875-1947)



sei o que que escrevo

não sei o que você lê

minhas palavras são como seixos no rio

estão no poema para serem roladas

polidas

levadas pela correnteza das metáforas



meu verso pede palavras simples

dou-lhe palavras simples

meu verso pede estruturas góticas

dou-lhe pontudas arestas de templos mágicos



meu verso faz parte de um poema estranho

vivo o estranhamento tanto quanto você

meu verso compõe o que nem eu mesmo ouso

deixo a seu critério o espaço entre o sonho e som



sei ou às vezes nem mesmo sei

o que escrevo

não lhe dou a chave do cofre

porque já ela está perdida há muito

pelos meandros de meu desespero



sei o mundo que está dentro de mim

não sei o mundo que está em você

leia apenas os meus versos sem atavios

navegue em si mesmo e não em mim

sei às vezes o que escrevo

e escrevo às vezes o que sei

não só da vida mas de mim mesmo

o que é muito pouco para ser cobrado



os meus seixos rolados pelos rios da poesia

nem sempre têm a poesia que apregoam

paciência

segue a trilha até o rio e mergulhemos nele

ao encontrar-me à margem pescando palavras

somos todos pedras rolantes da vida

em águas que não nos matam a sede

nem peixes nem plantas

apenas pedras polidas pelas águas da vida


11.8.207

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