11 de fev. de 2015

PETÚNIAS




 Georgia O'keeffe - Petunia No. 2




chovem petúnias brancas do céu noturno

no beco o banquete é farto
para o Zé carroceiro cata lata
que mata a fome
com o resto de frango
do meio do lixo

chovem petúnias azuis do céu noturno

passa a viatura e deixa
um rastro vermelho
do grito de alarme e dúvida
dentro da noite
Zé carroceiro lambe os beiços
atira os ossos para o cão que vigia
cata os trecos para seguir a ronda

chovem petúnias púrpuras do céu noturno

quebra-se então o silêncio
em mil pétalas
despetala-se o peito do Zé
gane e foge o cão
o rabo entre as pernas
a fome para sempre adiada

chovem petúnias vermelhas do céu noturno

estronda uma janela
do outro lado da avenida
apaga-se a luz
do apartamento de cima
o motor da moto explode
o encapuzado vira sombra
vira nada no novo silêncio
de petúnias coloridas que caem
do céu noturno e cobrem
os dois buracos no peito do Zé

a cidade agora dorme tranquilizada
não chovem mais petúnias do céu noturno



Joinville, 5/2/2015

São Paulo, 8/2/2015

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