(Valquíria Cavalcante)
- Lavar as mãos. Sempre. Muitas vezes ao dia.
Antes de comer. Depois de comer. Após um cigarro. Ao chegar da rua. Depois
de um aperto de mãos, esse de forma discreta, depois, sem que o perceba o
amigo. Lavar as mãos, sempre, muitas vezes durante o dia. Sem obsessão.
Antes de sentar-se ao computador. Depois de ler o jornal. Sempre manter as
mãos limpas. E o rosto de vez em quando. Com água fria, de torneira.
Desperta e mantém a pele saudável.
- Ainda a água, agora na higiene íntima. Após
defecar, lavar-se sempre. Com água morna ou fria, mas lavar-se sempre.
Papel higiênico só para se enxugar. E depois, com muito sabão, as mãos,
mais uma vez e outra e outra mais. Não obsessivamente, mas lavar-se.
- Escovar os dentes, sempre após as refeições, com
calma. Alguns dentistas dizem que por quinze minutos, pelo menos. Mas
escovar bem. E a língua, também: escová-la cuidadosamente. E as gengivas.
Com escova macia e um bom creme dental. Mais uma vez a água: em abundância
para enxaguar. Se usar um desses detergentes bucais, faça-o com moderação,
muita moderação, não mais que uma vez ao dia. E usar, sempre, fio dental.
- Roupa de cama: trocar sempre que possível. E
colocar, se possível todos os dias, ao sol para matar os ácaros.
Travesseiros também. Se tiver relações sexuais, mudar toda a roupa de
cama. E lavar com algum tipo de germicida líquido. Na máquina ou no
tanque, no molho.
- Roupa íntima (meias, camisetas e camisas
inclusive): troca obrigatória todos os dias. Sem perdão. E lavar, também,
com algum germicida líquido, no tanque ou na máquina, ao deixar no molho.
E enxaguar muito.
- Banho: também diária é a obrigação. Com água
morna, de preferência. Só no inverno, se não aguentar a morna, um pouco
mais quente. Nunca quente demais, pois descama além do necessário a pele.
Ao enxugar-se, friccione-se um pouco. Estimula a circulação.
- Unhas: mantê-las curtas e limpas. Também as
dos pés. Para a do dedão do pé, use, de preferência um corte reto,
abaulado para dentro, para não encravar.
- Fumo: fuja! Mas, se for impossível: no máximo
dez cigarros por dia; não fume com estômago vazio; não fume em lugares
fechados, principalmente no quarto de dormir; não fume diante de doentes e
crianças; não fume ao volante.
- Evitar: coçar os olhos, levar a mão à boca, usar
palitos de dentes, ficar em casa com sapatos de rua (é bom manter um
tapete na entrada da casa ou do apartamento, para limpar os sapatos antes
de entrar), andar descalço, usar roupas e sapatos apertados, usar roupas
íntimas de tecido sintético, beber e comer apressadamente e pisar em cocô
de cachorro, na rua.
Bem, por que todos esses conselhos agora? Pode estar perguntando eventual leitor. Ficou
louco o articulista?
Você conhece Isaac Asimov? Já leu algum de seus
livros? Asimov escreve ficção científica. Da melhor qualidade. Ou escrevia,
pois faleceu há poucos anos. Deixou obra memorável. Seus melhores contos e
romances falam de robôs. Até criou as leis da robótica, para dirigir o
comportamento dos robôs. Já ouviu falar? São elas:
·
1ª lei: um robô não pode fazer
mal a um ser humano nem, por inação,
permitir que algum mal lhe aconteça.
·
2ª lei: um robô deve obedecer
às ordens dos seres humanos, exceto quando estas contrariarem a primeira lei.
·
3ª lei: um robô deve proteger
a sua integridade física, desde que com isto não contrarie as duas primeiras
leis.
Então, há um conto de Asimov em que nenhum
computador consegue fazer os cálculos do salto quântico, que possibilitará as
viagens interplanetárias. Todos entram em pane, num determinado momento. E os
cientistas não sabem por quê. A última possibilidade é um supercomputador, um
cérebro eletrônico de última geração, capaz de quase tudo. As fórmulas e os
dados complexíssimos são, então, jogados em sua memória. Depois de algum tempo,
o computador parece que enlouquece. Começa a ficar estranho, a cantar canções e
dizer coisas desconexas, como se precisasse alhear-se do que acontece em seu
interior. Depois de muita expectativa, os resultados aparecem e a fórmula do
salto quântico é entregue aos cientistas. Que procuram, então, saber o que
aconteceu com o supercérebro, que enlouquecera e se alheara, como se sonhasse
ou entrasse em zonas imprecisas, enquanto realizava a tarefa. E descobrem que,
para realizar o salto, a nave e a tripulação precisariam desintegrar-se
(morrer) por algum tempo, para reintegrar-se (ressuscitar) depois, no infinito
do espaço sideral. Os computadores não faziam o cálculo porque isso implicaria
a morte de seres humanos, o que contrariava a primeira lei. O super-cérebro, no
entanto, percebera que a morte era transitória, embora real, pois havia um
renascer futuro. O que ele fez? Alheou-se, passou a cantar óperas, a dizer
poesia, a fazer-se de louco, enfim, para iludir a rigidez da primeira lei.
Foi mais ou menos isso o que fiz: não estou, no
momento, conseguindo escrever o que eu quero, ficção. Também a realidade que me
cerca anda tão deprimente, tão trágica até, que preciso dar um tempo,
enlouquecer um pouco, aliviar meu cérebro e tentar, quem sabe? fingir que nada
acontece, que é preciso ver o futuro e voltar a uma certa lucidez mental para,
então, conseguir realizar o salto que meu cérebro se recusa a dar. Por isso,
essas lições de higiene, que devem servir para alguma coisa, afinal.
7.6.2006