Um dia de chuva é tão belo
Quanto um dia de sol.
Mas dizer que são belos a chuva
Ou o sol faz parte somente de
Desejos do homem: não há
Na natureza o conceito de beleza.
A natureza é o que é,
Nada mais.
Só o homem subordina a sentimentos
O que, em estado natural, vida apenas exprime.
Vida que flui a vida na pedra solta
No meio do riacho, no musgo que imprime
O seu sulco no tronco da árvore, no pássaro
Que bica a pitanga já madura. Não tem
Filosofia a estrela que brilha.
Ódio não há
Na caçada do leão; nem vingança
Na arrebentação das ondas
Em noite de preamar.
É da natureza negar a possibilidade
De deuses e altares: ela apenas reflete
Seu próprio existir. Quando o homem sonha
Os sonhos que lhe aprazem, contraria
O reto caminhar das coisas que aí estão:
Segue a pedra sendo pedra e o pássaro,
Pássaro. No rio, as águas que correm
Não têm em seu correr
A vontade disso ou daquilo:
É da natureza do rio
Arremansar-se em lago nos tempos
De estio e arremessar-se
Em turbilhões nos tempos de cheia.
Louco, somente o homem com seus
Deuses tristes e no uso que faz
De forças que não domina. Por isso,
Encontra trevas em seu pensamento, enquanto,
À luz da Lua, reflete o lago
As mesmas águas do meio dia.
Da árvore colhe o homem
O fruto que mata a fome:
E não há no fruto
Nem sabedoria nem malefícios
Que levem ao conhecimento de deuses.
Na fonte que mata a sede
Não encontra o homem numa gota sequer
O desejo de mitigar ou curar.
Da natureza tira o homem
A força para continuar,
Sem que haja uma só manhã
Que traga algo mais que não a luz
De cada dia.
A natureza não é sábia
Nem tão bela quanto
Os deuses que o homem cria.
Apenas segue o seu curso.
Como, aliás, o próprio homem,
Se tanto.
Segunda-feira, 26 de agosto de 2002
Terça-feira, 27 de agosto de 2002
Quinta-feira, 17 de outubro de 2002
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