27 de ago. de 2015

eu e todos os poemas






escrevo poemas que ninguém declama
escrevo romances que ninguém publica
escrevo artigos a que ninguém dá atenção
escrevo peças de teatro que ninguém leva ao palco
e aí você diz
que merda de escritor você é
e eu digo sim que bosta de poeta
que idiota de articulista
que porra de escritor
eu sou
mas
e daí?
que se foda o mundo e quem dele depende
para ser feliz
faço o que quero no silêncio dos meus versos
tanto quanto na cagada que dou no silêncio da privada
sei o que sou ou o que não sou
vagando no mundo como sombra
de mim mesmo
não sou cachorro treinado nos salões da burguesia
minha sombra me conduz ou eu a conduzo
pelos caminhos que escolho ao sol ou à lua
porque caminho com meus próprios pés
e se deixo alguns rastros são rastros de meus pés
a caminhar com firmeza levando erguida a minha cabeça
não cato restos de comida dos banquetes engravatados
até porque precisaria usar gravata para neles estar mesmo como mendigo
e eu odeio gravatas
se meus pés não têm calos dos caminhos que trilharam
é que sapatos eu nem uso mais
já que os odeio tanto quanto às gravatas
sou livre em minha solidão que é a prisão que escolhi para mim
e mesmo o meu caminhar pode ser apenas a imaginação
a sondar os estreitos leitos de rios secos
sonhando com cachoeiras em que eu possa me atirar
como folha seca de árvores que se renovam
escrevo sim versos improváveis livres e soltos como o meu pensamento
loucos são os outros e mais que os outros eu mesmo em mim
a me julgar assim e se me acharem que minto que vão todos
para as devidas merdas que são suas vidas
continuarei escrevendo meus textos todos os dias todas as noites
ao sol e à lua e às estrelas dedicados
que me importam os olhos cegos que não os leem
que me importam os ouvidos moucos que não os escutam
que me importam plateias estúpidas que não os aplaudem
que me importam discussões inúteis nas esquinas de ruas vagabundas
o vento que sopra ao meu ouvido
não traz tempestades por causa dessa gente
sou aquele que caminha com esse vento e busca
nas águas dos rios que correm sem destino
o destino de cada palavra que lanço na folha branca
ou na tela do computador
as velas infladas levam meu barco por corredeiras e cachoeiras
às quais me lanço sem esperança
mas sobrevivo a todas as quedas mesmo moído nas pedras
por isso e só por isso escrevo e torno a escrever
poemas sem pé e versos sem cabeça
textos sem reflexão ou tão profundos quanto a minha própria desilusão
marco a minha presença nas margens da vida
que passam mais rápidas que meu suspiro a vagar no barco sem destino
que é meu próprio destino
e sigo vivendo apenas porque respiro
apenas escrevendo
escrevendo poemas
que ninguém quer
livros que ninguém
publica
textos
de
pouca
ou
nenhuma
importância
e que se foda o mundo e quem dele dependa para ser feliz




14.8.2015




22 de ago. de 2015

POEMAS DEPRESSIVOS



(Dino Vals)






Depois de tudo,


Estou na mesma.


Preciso


Retomar com urgência


Essa vida,


Sábia vida,


Sacal,


Antes que por


Ora me mate.

30.10.92




quando está seco o leito


do rio


não há nuvem que traga


qualquer esperança:


quando está triste o peito


no estio


não vê luta que traga


sonho e bonança


16.9.2000





bebo e refaço


o tempo de não sei o quê






abraço o tempo


enlaço o ensejo


balanço lento


qualquer desejo






fui o que sou


e sou o que fui


estou onde queria


e queria estar


onde não estou






sofro em mim


dentro de mim


o que o em mim


um dia foi o que sou


e é só o que penso


agora que não mais


quero ser o que não fui


deixo que corroa


em peito o cupim


deixo que sofra


o que nunca sofri


sou e sou e sou


mais do que estou


que a vida seja o que um dia fui


e aquilo que um dia fui


seja hoje o que ainda sou


nada mais


23.4.2015

21 de ago. de 2015

uma gota de sangue



(Botero)



eles estão lá, quietos, em suas tumbas
as mãos cruzadas sobre o peito,
flores murchas ao pé do caixão
mudos e quietos, quietos e mudos;

eu disse quietos? quem dera!
eles estão lá à espera
de que um vivo dê um safanão
num travesti; de que um policial
atire num negro e diga para a família
que ele atirou primeiro; de que um eleitor
desavisado mostre que não é de direita
e leve uma surra;
de que uma garota mais descolada
saia à rua com saia curta
e seja chamada de puta;
de que um apresentador de televisão
diga ao vivo e em cores que bandido
bom é bandido morto;
de que um deputado sem noção
queira prender menor delinquente
para que se encham as cadeias;
de que um moleque idiota convoque
a marcha dos fascista contra tudo
e contra todos para que alguns encapuzados
botem fogo na cidade; de que o pastor
recolha o dízimo e faça um falso milagre
para que toda a mídia diga que chegou
o dia do juízo final; de que o papa
pregue que pedofilia tem que ser combatida
e jogue para debaixo do tapete
do Vaticano toda a porqueirada...

mas principalmente eles estão lá
à espera de uma gota de sangue,
uma só gota de sangue para que
possam abrir a boca e bater as dentaduras,
erguer os braços e soltar o grito preso
heil hitler, heil hitler, heil hitler
e soltar enfim seu bafo sobre nós,
seu bafo podre de negras tragédias;

sim, eles estão lá, em todos os cemitérios
de todas as cidades, mas na verdade
não estão quietos nem mudos nem
mortos
esperam apenas que um de nós
apenas um
derrame
a gota
de sangue
a go
ta
go
ta
a
g
o
t
a
.
.
.


25.7.2015



17 de ago. de 2015

mendicância





(Norman Rockwell)




eu podia estar te acariciando
eu podia estar te beijando
eu podia estar fazendo amor com você
mas estou aqui
escrevendo este poema e pedindo
só um pouco da sua atenção



17.8.2015

14 de ago. de 2015

POEMAS DE AMOR E SEXO


  

 (Cecily Brown.- two figures in landscape)
  
1.   língua

no amor
quem
tem
 língua
não morre
à míngua


2.   fruta


tu quando acabas
tem teu gozo o gosto
de jabuticabas



3.   dolência


silêncio no quarto
depois que me chupas
sinto-me farto

4.   fogo



quero-te chama
mesmo que molhes
minha cama



5.   sim!


mordo-te
o seio
gritas
que o gozo
já veio


6.   apelo


a teu apelo
não nego fogo:
chupo teu grelo,
colho teu gozo


7.   união



vem, tu dizes,
meu corpo é chama
e então somos felizes
na mesma cama


8.   tesouro


fechado o ânus como um cofre
há somente uma chave para abri-lo
por isso, para entrar, o pau sofre
faz seu dono perder um quilo
e precisa agir com toda a perícia
mas depois que entra – que delícia!



9.   intimidade



quero a intimidade da carne
sem nenhum pudor
por isso, teu pequeno botão
molho com muito charme
até abri-lo na mais bela flor



10. cilícios



a ti me entrego em holocausto
na chama que nasce de teu vício
é teu corpo em transe um fausto
que compensa o meu suplício
não te nego e tu não me negas
mesmo quando aperto teus cilícios
sou eu a morrer em mil entregas



11.  atriz


na cama-palco em que atuas
fazes-me tu mais feliz
quando tuas ancas nuas
abrem-se nesta disputa
entre teus encantos de atriz
e o nobre destino de puta


12. úItimo



enquanto no banho te lavas
penso, louco por foder-te:
vieste puta como as  escravas
mas não é assim que quero ver-te
se por qualquer dinheiro me davas,
quero sim ser o último a comer-te


13. pressa



dispo-te em dois segundos
em louca ânsia de amar
no entanto correste mundos
e fundos
para achar
a mais linda lingerie
que - desculpe, eu não vi –
pudesse me agradar



14. aquecimento global



beijo-te, beijo-te toda
desde a tua nuca nua
à ponta dos dedos dos pés
beijo- te, sim, aqueço-te toda
antes que o mundo se aqueça
antes que o mundo se foda



15. prazer solitário



gosto, sim, do teu cheiro
do teu gosto eu gosto, sim
vibro com teu gozo
anseio por teu corpo
tua pele nua, teu olho
tua ilogicidade no sexo
teu prazer no inusitado
gosto, gosto, sim, de
estar contigo, meu amor
mas, ah, gosto mais
- e hás de me perdoar
por isso – meu amor
gosto mais ainda de
pensar em tudo isso
quando tu não estás!



16. afterglow



sabe aquele instante
depois do gozo, quando
estás entre a vigília e o sono
nem dormida, nem acordada
no lusco-fusco da consciência?
pois, é aí, meu amor, que eu
tenho o maior tesão por ti
é quando, então, entre tuas
coxas nuas me ajoelho, e
colho e sugo o sumo
da tua vulva-lua ainda
úmida o sêmen que,
com tanto júbilo, acolheste
sou nesse momento
o mais feliz dos homens,
meu amor semiadormecido.



17. poemas de amor



que sejam breves
os poemas de amor
breves como o leve
espasmo
de teu corpo,
meu amor, na hora
do orgasmo.



18. eterno



para que no me olvides
disseste
e enfiaste as unhas
em minhas costas
não gritei
não xinguei.
apenas te olhei
e, como se fosse possível
esquecer-te,
deixei
com minha língua
um gosto amargo
 em tua boca
 e gozei.



19. flor de maio



abriste-me teu corpo
com todo o teu perfume
com todo o teu orvalho
por uma noite apenas
apenas por uma noite



20.      tesão



desce minha boca
ao teu ventre
louca
de desejos
abres-te à língua
e entre mil beijos
e gemidos tu choras
doida que eu te foda
e imploras
 mais que teu grelo,
que eu te coma toda



21. paixão



o arrepio
do teu seio
não é de frio
mas de receio
de que não
te morda
de que não
te foda



22. liquidez



chupas-me
 e me olhas
chupo-te
e te molhas
e também:
chupo-te
e me olhas
chupas-me
e te molhas



23. simples assim



são tão simples as curvas
do teu corpo
são tão diretos os caminhos
do teu corpo
são tão previsíveis os fluidos
do teu corpo
são tão comuns os anelos
do teu corpo

mesmo assim me perco em curvas
mesmo assim retomo caminhos
mesmo assim bebo os fluidos
mesmo assim procuro os anelos

porque, amada,
mais que curvas, caminhos, fluidos e anelos
és o gozo que encontro em cada toque
cotidianamente
sem qualquer prurido, sem qualquer culpa



24.      dia de preguiça



hoje não, amor
que é meu dia de preguiça

sim, eu sei do que tu gostas
eu sei bem como tu gostas
e daqueles jeitos todos
tu me dás, depois, muito cansaço

então, hoje não, amor
que meu dia é de preguiça

sim, eu sei que promessas
foram essas
que beijos foram depregados
e grudados
e tudo o mais
mas, e depois, amor, e depois?

não, é melhor não, que hoje
é meu dia de preguiça

gosto, sim, amor, quando tua
língua me percorre, quando
tuas umidades me esquentam
quando nua
te abres e te abandonas
mas, enfim, hoje
não que eu não queira
não que eu não deseje
mas, enfim, é sim, meu dia
meu dia de preguiça

e por ser hoje o meu dia
de preguiça, vem aqui perto
e deixa
que eu te veja apenas
que te olhe
que me molhe
só com o pensar
sem tocar
 sem outro tesão
que o dos olhos

claro, amor, amanhã
de manhã, talvez
mas, sim, com certeza
com absoluta certeza
amanhã à tarde,
que hoje...

hoje é meu dia de preguiça



25. oração 1



de joelhos
com minha língua
rego teus pentelhos



26.oração 2



de joelhos ela fica
a olhar-me enquanto sua boca
abocanha minha pica



27. oração 3


quero apenas teu gemido
enquanto deixo o teu grelo
muito bem lambido


28. oração 4



teu corpo entre meus joelhos
minha pica entre teus peitos
fodo-te de todos os jeitos


29.oração 5



de joelhos tu estás
de joelhos também estou,
quando te como, assim, por trás


30.oração 6



ajoelhas-te sobre meu ventre
e ganhas o mundo
com minha pica bem no fundo



31. oração 7



de joelhos sobre minha cara
minha língua encontra
a pérola mais rara


32. oração 8



preparas-te para a foda
de joelhos sobre a cama
tua bunda apaga o sol
e teu ventre vira chama


33. oração 9



não, não há escrava nem senhor
quando, abraçados e nus, de joelhos
nossos sexos trocam fluidos de amor



34.tempo



há o tempo de querer-te
- e beijo os teus lábios
há o tempo de foder-te
- e ficamos mais sábios


35. muito bom



muito bom quando
esorrego assim, chupando
teu grelo, tua fenda, e nego
que gozo na renda de tua
bunda nua, na funda caverna
que esconde – oh! onde? onde? -
no segredo do teu espasmo
o enredo do teu orgasmo



36. despedida



depois do amor, ainda nua,
lânguida, abotoas o sutiã
então eu sei que a lua
já cede lugar à manhã



37. nudez



 - quero-te nua
como os lírios
do campo
sorriste
 e num gesto amplo
tiraste os cílios



38. vida



sopro de leve os pelos
de teu púbis
e abro teus segredos
os lábios retêm teu grelo
e tu gemes baixinho
de novo o sopro, de novo teus pelos
se arrepiam na breve aragem
é só a vida gozando em minha boca



39. um dia, um gato



chamas-me gato
enquanto coleio pelo teu seio
e desço até teu ventre
e, antes que digas – entre –
só um pouco te arranho
e passeio e te arrebato
te dando um bom banho
de língua de gato. 



40.      livro



abro tuas pernas
como abro um livro de aventuras
não, expresso-me mal, minha querida
não são apenas aventuras
o que busco entre tuas coxas nuas
mas, sim, muito mais, busco a ventura
a suprema ventura do teu gozo



41. haikai ou haiku



alguns chamam kaikai
eu chamo haiku
porque tu dizes ai
quando como o teu cu



42.       onde?



- sabe o conde?
 - que conde?
 - aquele que se esconde?
 - esconde onde?
 - ora, onde o sol se esconde...
- ainda não sei mesmo onde...

(e, mais uma vez, eu como seu cu)


43.depois



agora você me diz:
depois que você goza
fica quieta ou fica prosa?
ou só um pouco feliz?



44.      boca



quem tem boca
não morre à míngua:
se falha o pau
nunca falha a língua



45.merda



não reclames que é de pobre
a merda que teu cu caga:
quando minha pica te enraba
encontra nele a função mais nobre

(Natal, RN, 7.6.2011)


46.      se eu fosse...



imaginá-la a cagar me faz um gosto e um desgosto:
vejo-a a liberar a massa pastosa e fétida
que, de qualquer forma, é acariciada
pelas carnes íntimas de você
coisa que eu, sem acesso a esse universo,
penso valer menos que um troço
que um naco de merda
ah!, se pelo menos merda eu fosse,
a sua merda!


47.      velas na cama



pedes que eu acenda velas
velas de luz e desejo
e que as espalhe pela cama

e  coberta de pejo

usas todas as velas, todas elas,
para me queimares

boba, eu penso, que velas que nada
tu me queimas já no primeiro beijo



48.      conversão



tu me dizes que te vais converter
a uma seita qualquer
então, mulher,
grave questão se levanta
que o mundo perderá uma puta

mas não ganhará uma santa




fim