6 de mai. de 2019

o catamita - 1










invejava-lhe apolo o esplendor das faces

os lábios rubros e perfeitos

o nariz reto de férteis terras gregas



invejava-lhe vênus a redondez calipígia

as colunas macias e fortes a sustentar

tais perfeições no olimpo moldadas



invejava-lhe priapo o aríete sempre pronto

para batalhas necessárias ou possíveis

com ternura e força e sem espanto



era tudo isso de beleza e força

para do imperador apenas o desfrute total

em troca de ouro e de mais que tudo

em troca do escárnio a inimigos

e do desfile impune a qualquer ameaça



não era a sombra atrás do trono

era o motivo mesmo de toda a grandeza

que aos súditos mostrava o seu senhor



um dia porém à corte chegou

um pobre e maltrapilho poeta

já nos anos entrado nem tão belo

nem tão poderoso nem tão de encantos

pudesse do seu físico viver ou morrer

tinha apenas como trunfo a lira

uma lira de mais poder que qualquer reino

que pudesse sobre a terra existir

deixava feridos os corações ao entristecer

alegrava a vida ao cantar o prazer

enlevava os espíritos aos deuses

quando num canto fazia aparecer

o olimpo todo num só verso num só acorde



e o jovem belo como os deuses

ao vate não resistiu e a ele seus encantos todos

entregou como oferenda de vida e morte

em promessas divinas de eternos mistérios



chora hoje o imperador em seu túmulo

todos os dias o amargo arrependimento

de tê-lo um dia tanto e tanto amado

a ponto de também tê-lo assassinado



sua dor é tanta e tanto o pranto derramado

que todo o império em décadas conquistado

virou terra de ninguém hoje aos pés ajoelhado

de bárbaros e monstros do olimpo enviados





4.4.2019


(Ilustração: Antinoo - museu do Louvre 
- foto de autor não identificado) 


Você pode ouvir esse poema, na voz do autor, neste endereço de podcast:




Um comentário: