há um verso dentro de mim que deseja virar poema
e quando o poema nasce o verso vira vento
por ter cumprido a pena de ser fonte
que traz a vida ao pensamento esse poema
em lampejos e desejos e anseios permutáveis
o infinito em pontos e vírgulas transtornado
o tufão em brisa enfim mitigado
o sonho sabe a sonho e sabe a flor
na areia do meu deserto o verso vira grão sem destino
e o cheiro de terra molhada encharca cada sílaba
sente-se o passo do destino a plantar cruzes pelo caminho
e tudo o que obtém é o espanto das estrelas
que continuam brilhando embora o dia ofusque a retina
mas tudo quanto se passa no seio da selva
salva-se ao lento perpassar dos ventos da noite
o verso inútil que pulsa ainda dentro de mim
entorna em lágrimas um doce canto
há esperança nos ares cortados com asas dos pássaros
e há depósitos vivos de amores mortos
dentro de poemas que nascem tortos
de um verso que não devia ter obtido a cidadania
choremos todos por essa desastrosa harmonia
que a terra aos olhos mortos de dinossauros
ressurja ao acalanto do último orgasmo dos amantes
na noite inglória de poemas que nascem tortos
de um versovento ao desalento da minha poesia
mais estranhas as palavras agora do que antes
enquanto o verso se enrola nas nuvens da manhã fria
à branca luz irradiada dos ossos dos amantes mortos
27.5.2019
(Ilustração:Theodore Gericault)
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