13 de mai. de 2022

minha solidão

 




como um gato velho no canto escuro da sala curto minha solidão

livros

música

meu corpo moldado à rede no quarto quase vazio

as paredes nuas

a televisão desligada

e a mente divagando pelas ondas do rádio e pelas páginas do livro

sem mágoas ou pensamentos que não sejam meu momento ali

presente em carne e osso no instante parado no ar

o tempo ausente

a vida exterior ausente

só eu e meu divagar profundo comigo mesmo

o sangue correndo nas veias impulsionado por um coração de esperança nutrido

o ar nos pulmões já sem qualquer vestígio dos malditos anos de fumo

talvez um pouco de dor aqui ou ali

e isso faz parte do fardo dos anos nas costas

nada que perturbe esse isolamento entre bilhões de pessoas

nada que perturbe o lento e constante passar de letras ante meus olhos

e o profundo sentimento do mundo que está lá fora

sem que eu esteja nesse mundo como folha morta

apenas solitário sem causa

apenas um gato a ronronar na rede respirando o resto de vida que tenho para viver




30.1.2022

(Ilustração: Jean-Baptiste Debret - 1827)

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