quando estou assim triste
triste de dar dó
porque sozinho numa tarde de outono sem sol
triste como passarinho sem alpiste
peso na gaiola
penso em sair por aí e achar o caminho que me leve
como folha ao vento
para a pasárgada de bandeira
não sei se lá teria a mulher que eu quero
talvez ela também – essa mulher de minhas fantasias –
esteja por aí à toa procurando sua pasárgada
ou na cama do homem que lhe quer
ou do homem que ela quer
sem saber que seria eu esse homem – talvez apenas um idiota
nefelibata sem nuvem
fugitivo de mim mesmo numa pintura de van gogh
e porque estou assim triste
triste como sabiá na palmeira
canto um pouco a minha solidão
com voz rouca de cantor argentino
acompanhado por um quinteto de piazzolla
mas sou muito desafinado
desafinado como a minha tristeza
nesta tarde sem sol em pleno outono
numa tarde que não é quente nem fria
e o frio que sinto vem de dentro de minha solidão
então quero ir para minas e drummond não há mais
fico no meio do caminho de todas as vidas
perdido entre o meu inferno e o paraíso de bilac
sem encontrar nem virgílio nem beatriz
e porque estou triste
triste de dar nó em pingo d’água
levo meu pensamento para o passado perdido
num plenilúnio de maio em montanhas de minas
e choro mais uma vez um amigo querido
que viaja há tempos para sua pasárgada
nas asas de um paulistinha
de que eu devia ser o co-piloto
30.3.2021
(Na foto, de auor não identificado: Vitório Pereira Resende)
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