esgarça-se o tempo dos arrependimentos
para todos aqueles que escolheram o caminho do pandemônio
o demolidor estende suas garras
tira um por um – na surdina dos decretos impublicáveis
urdidos nos gabinetes acarpetados – os tijolos da construção mal rebocada
cai cada carta do dominó do demônio
ao sopro das profundezas da garganta da serpente
nas paradas das botas que batem no asfalto
no suor da floresta que desaba
nas cátedras corroídas pelo cupim da negação
nas pipetas vazias aos olhos dos aventais amarelados
choram mulheres nos cantos dos lares
choram as plumas das cores do arco-íris
planejam guerras os meninos sem destino no desatino da fome
cobrem-se de pústulas as costas dos mendigos
apertam os cintos os mercadores de quinquilharias da fé
caminham a esmo os profetas a contar nos dedos os dias de caos
ratos saem das tocas e baratas voam no bico dos pássaros
os ventos podres que sopram do norte arrepiam as mentes
e levantam as saias das putas e das beatas
nos povoamentos superpostos de morros derretidos
a chuva que corrói não vem das nuvens – vem dos desejos
de morte do olhar do assassino que rege a marcha fúnebre
os loucos dançam a dança macabra
e batem os dedos na têmpora
ao ritmo do último canto de desalento
- imitam com seu gesto de olhos esbugalhados
a continência aos desmandos do líder dos fasci di combattimento
canta enfim a pátria armada
o festival da ruína programada
enquanto se engraxam os coturnos nos desvãos dos quartéis
para pisar de novo as barbas do rei da nota de quinhentos réis
e agora ninguém pode fazer mais nada
19.4.2021
(Ilustração: Marcella Chapman - desolation)
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