(Botero - dores da Colômbia)
Na tela da televisão, em horário nobre,
a foto do terrorista.
Matara a tiros de fuzil
dezenas de pessoas
num shopping qualquer
de qualquer cidade de um país ocidental.
Disse a polícia ser ele
soldado do estado islâmico,
perigoso homicida que se matou
logo após o crime hediondo.
Desalmado ser cuja alma
agora transcende as armas
com que tanta gente ferira,
com que tanto inocente matara:
busca lá na etérea morada de seu deus
as setenta e duas mil virgens prometidas.
Desalmado de alma islâmica,
sua barba comprida, seu nariz forte,
sua testa orgulhosa na tela da televisão.
Sedentos de notícias, os repórteres do mundo todo
alvoroçaram-se - como moscas - em busca de informações:
entrevistaram amigos, parentes, vizinhos do feroz terrorista.
Rapaz educado e prestativo, diz alguém.
Bom moço, respeitador, a todos ajudava, diz outro.
Silencioso, sempre, mas calmo e bom, diz um terceiro.
E a foto na tela da televisão
não tem o terror requerido
para os monstros de assassínios em massa:
a foto da televisão tem a calma do olhar
do jovem mestiço de árabe e europeu,
menino ainda, nos seus dezenove anos
- podia ser meu filho, ou teu filho; podia ser
meu irmão, teu irmão; podia ser meu primo, teu primo –
até nos esquecemos de que tão belo jovem
de calma e pura tez
matou sem dó dezenas de pessoas.
Esse moço, tão jovem, tão belo – quem podia imaginar – já desejando
as 72 mil virgens prometidas pelo profeta.
23.7.2016
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