4 de set. de 2017

folhas ao vento


 

(Kay Sage)



folhas sopradas pelos ventos

meus sentimentos vagueiam pelas calçadas imundas

comendo restos de comida roubados aos cães

rastejando esmolas nas escadarias do poder

vestindo trapos encontrados nas lixeiras 



folhas sopradas pelos ventos

meus pensamentos desnorteiam-se pelas estradas inúteis

peregrinos coxos a trautear entre cidades mortas

defenestrados de mim mesmo como párias

vestidos apenas de ócio e vergonha



não os renego todavia nem aos sentimentos nem aos pensamentos

são eles os que travam no meu peito a ânsia de morte

são eles que repetem a cada momento o meu estranho viver

caminho com eles como caminharia com os lobos

estranhando entre nós mesmos as nossas angústias

competindo às vezes por um naco de lucidez

sem eles não viveria e eles sem mim são essência morta

por isso caminhamos entre o lodo e o espaço vazio

na vida que nos é possível viver e conviver

como náufragos ou mendigos a depender do alheio olhar

folhas sim sopradas pelos ventos frios das madrugadas

mas aconchegados inelutavelmente únicos e indivisíveis





15.1.2017




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