paixão de 16 anos
aos 16 anos a paixão
sem trégua
se bebia água pensava em ti
se jogo futebol penso em ti
se subi na mangueira pensei em ti
o tempo dentro de mim era o tempo de pensar em ti
não havia em mim nada que não fosse o pensar em ti
obsessivamente eu penso e penso e penso em ti
és tu a vida que palpita ao brilho do sol na manhã de primavera
és tu a responsável por esse lugar comum de falar do brilho do sol
na manhã de primavera como se fosse um verso de camões
eras tu a fruta proibida no quintal do vizinho que eu desejava
mas não ousava pular a cerca de arame farpado que nos separava
só as mãos trêmulas sujas de barro e sangue
serias tu a essência absoluta do encanto e do desencanto
paixão aos 16 anos
aos 16 anos a paixão
absoluta
e um dia tu
e um dia você
e um dia não houve amanhã
e um dia abriu-se o abismo
meus olhas não tiveram talude
que impedisse o derrame das águas de verão
águas que vieram como lavas de um vulcão
deixaram sulcos profundos no meu corpo
cicatrizes que contemplo no espelho embaçado do meu quarto
sessenta anos depois
porque naquele dia tu foste
porque naquele dia você foi
porque naquele dia
naquele dia
naquele dia não a vi nunca mais
nunca mais
nunca
16.12.2019
(Ilustração: Alyssa Monks)
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