27 de mar. de 2021

tarja preta

 




porém felicidade não se compra na farmácia

- foi quando pulava a amarelinha

que a estrela riscada no céu de cimento

brilhou à luz do negro de seus olhos

- passou dias e dias no segredo de um cofre

apertada entre os parafusos dos seus sonhos

- pegou malária na amazônia

no quarup de seus mortos não enterrados

(partícipes todos eles do banquete antropofágico de seus estranhamentos)

- beijou os pés de estátuas de deusas nuas

em cerimônias de fertilidade á luz de falsas luas

e quando enterrou o feto de suas ilusões ao pé do mamoeiro

ouviu cantar o sabiá nas palmeiras do poeta

- recebeu passes da mãe de santo nas rodas de terreiro

pagou o dízimo de sangue ao pastor enlouquecido por dinheiro

rezou missas negras aos demônios todos que prometiam

a luz da fogueira ancestral acesa no fundo do seu poço sem estrelas

e terminou seus dias na camisa de força da bula de um tarja preta





14.2.2021

(Ilustração: escultura de Matt Verginer)

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