vou-me embora pra pindaíba
lá sou amigo do rei dos mendigos
e posso ler em paz os meus poetas
lá tenho a cama que eu quero
numa folha de jornal
lá não tem mulher que me aporrinhe
nem homem que me explore
em pindaíba sou feliz e também infeliz
sofro e choro o choro do escravo fujão
rio-me sozinho pescando sem anzol
sem roupa nenhuma deixo o sol me queimar
sem fome nenhuma para me atormentar
como a minha sede no suor no meu rosto
bebo a minha fome cutucando o buraco do dente
fui-me embora pra pindaíba
a buscar meu quinhão de vida sofrida
e quando cheguei lá pobre pobre de marré de mim
fiquei mais puto que os putos do bordel
não tem mais pindaíba
não tem mais nada lá
nem boi mugindo nem boi pastando
só silêncio de piroga afundada
e até em pindaíba uma pobreza igual à minha
está fudida e está lascada
pois não encontra mais é nada
28.9.2021
(Ilustração: Max Klinger)
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