o nojo que se sente
pelas ruas de são paulo
esse fedor de urina e merda
não vem esse fedor de urina e merda
das bundas do povo da rua
são nojeiras que descem
das mansões de luxo da elite
- rios de urina e merda –
- rios ricos de ouro e prata –
a merda que sai da bunda dos miseráveis
é merda gestada nas bocarras ridentes
de bilionários insensíveis – que não pagam impostos
de governantes comprados – que só pensam nos ricos
dos políticos corruptos – que só fazem obras superfaturadas
o cheiro podre da urina dos miseráveis
nasce nas garrafas de vinhos romanée-conti grand cru
bebidos sobre tapetes persas de apartamentos de 600 metros quadrados
nos chamados bairros nobres da cidade que naufraga
que naufraga na urina e na merda mais rica do mundo
mijadas e cagadas em latrinas banhadas no ouro dos rios amazônicos
não culpe portanto – meus amigos e amigas - os miseráveis
pela imundície que sangra seus narizes e arrepia sua pele
o que sangra o pobre é a faca afiada
do desprezo
o que sangra o pobre é a faca dourada
da insensibilidade
a mesma faca afiada que corta o pescoço das aves que engordam o foie gras
a mesma faca dourada que passa no croissant fartas porções de caviar
eles – os poderosos – comem comidas poderosas
eles – os poderosos – bebem bebidas poderosas
e os miseráveis todos das ruas da cidade
cagam e mijam essas comidas e bebidas poderosas
que nunca cheiraram e nunca provaram
resta a eles – aos miseráveis das ruas da cidade –
a folha de alface murcha da lixeira do restaurante de luxo
a folha de alface murcha sonhada como endívias em cremes de ouro
resta a eles – aos miseráveis das ruas da cidade –
o osso do peru de natal da classe média
o osso do peru da classe média roído como carne do boi wagyu
resta a eles – aos miseráveis das ruas da cidade –
o resto de coca-cola azeda no fundo da garrafa jogada no meio-fio
o resto de coca-cola azeda bebida como uísque 12 anos
o caviar - o vinho – a alface murcha – o osso roído – a coca-cola
não importa quem bebe
não importa quem come
se tudo vira merda
a merda eterna que pelas paredes de mármore de carrara
das mansões dos poderosos
portanto – meus amigos e minhas amigas –
relevem o cheiro de urina e merda
das ruas da cidade
que o cheiro podre não vem da bunda dos miseráveis
o cheiro podre das ruas da cidade – de todas as cidades –
vem da bocarra infame dos engolidores de dólares
que só engordam nossos fígados
para comê-los como canibais
nos banquetes e orgias das bolsas de valores
são eles a urina que mijam os miseráveis pelas ruas
são eles a bosta que cagam os miseráveis pelas ruas
3.1.2024
(Ilustração: Gustave Doré - Dudley Street Seven Dials, 1872)
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