1 de mar. de 2018

Resgato da memória um poema perdido






para tentar lembrar os dias passados:

cidades da minha infância,

nomes estranhos na poeira da memória

- Lavras, Três Pontas, Três Corações.

Rios que as banharam

continuam não os mesmos

dos tempos idos

e vividos.

Os passos descalços do menino de rua

perderam-se no asfalto da grande cidade.

Os ecos dos cantos de seus pássaros

são hoje cantigas que não relembro.

O cheiro do mato, seus morros tão verdes

são o tesouro escondido no fundo da dor.

Saudade!

As casas baixas de janelas para a rua,

os becos escondidos, os frutos proibidos,

fundem-se todos em massa disforme.

Nem a saudade que sinto é a mesma saudade

dos tempos em que ainda me permitia

cantar os loucos suspiros

ao luar.

E enquanto escrevo (preso às palavras),

como dói este poema inútil!

Como dói no fundo de meu ser!

Antes deixara perdidas na bruma

as cidades amigas/amargas

de dias felizes que não revisitarei.

Cidades de minha infância,

acordaram suas lembranças

ao poeta que sonhava

ou sobrevivia

ao pesadelo sempre igual dos dias cinza.

O poeta que, de tanto levar porrada na vida,

já se sentia liberto

de uma infância talvez não vivida.

E assim, de repente, surge funda uma saudade.

E assim, de repente, emergem das brumas,

ruas, becos, vales e montes

perdidos como perdida uma vida,

doendo fundo nas veias,

resgatando sonhos e esperanças.

E as sensações sentidas,

mais do que as vividas,

antes presas, amordaçadas,

rompem diques

e arrastam a memória cansada

por caminhos esquecidos.

E a realidade que explode à volta

faz-se grão e pó e nada.

Fantasmas,

loucos dias de um remoto tempo,

pássaros negros num fundo azul,

riachos podres em vales perdidos,

tudo o que um dia julgara sepulto,

vive, revive, revolta

o momento eterno da dor.

Cidades da minha infância,

não são nem um retrato na parede.

São apenas a dor esquecida

e um dia lembrada

em momentos de loucura e depressão.

E qualquer som, imagem ou perfume

que as tragam de volta

são apenas sensações da memória.



S.P. 16.3.83

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