para tentar lembrar os dias passados:
cidades da minha infância,
nomes estranhos na poeira da memória
- Lavras, Três Pontas, Três Corações.
Rios que as banharam
continuam não os mesmos
dos tempos idos
e vividos.
Os passos descalços do menino de rua
perderam-se no asfalto da grande cidade.
Os ecos dos cantos de seus pássaros
são hoje cantigas que não relembro.
O cheiro do mato, seus morros tão verdes
são o tesouro escondido no fundo da dor.
Saudade!
As casas baixas de janelas para a rua,
os becos escondidos, os frutos proibidos,
fundem-se todos em massa disforme.
Nem a saudade que sinto é a mesma saudade
dos tempos em que ainda me permitia
cantar os loucos suspiros
ao luar.
E enquanto escrevo (preso às palavras),
como dói este poema inútil!
Como dói no fundo de meu ser!
Antes deixara perdidas na bruma
as cidades amigas/amargas
de dias felizes que não revisitarei.
Cidades de minha infância,
acordaram suas lembranças
ao poeta que sonhava
ou sobrevivia
ao pesadelo sempre igual dos dias cinza.
O poeta que, de tanto levar porrada na vida,
já se sentia liberto
de uma infância talvez não vivida.
E assim, de repente, surge funda uma saudade.
E assim, de repente, emergem das brumas,
ruas, becos, vales e montes
perdidos como perdida uma vida,
doendo fundo nas veias,
resgatando sonhos e esperanças.
E as sensações sentidas,
mais do que as vividas,
antes presas, amordaçadas,
rompem diques
e arrastam a memória cansada
por caminhos esquecidos.
E a realidade que explode à volta
faz-se grão e pó e nada.
Fantasmas,
loucos dias de um remoto tempo,
pássaros negros num fundo azul,
riachos podres em vales perdidos,
tudo o que um dia julgara sepulto,
vive, revive, revolta
o momento eterno da dor.
Cidades da minha infância,
não são nem um retrato na parede.
São apenas a dor esquecida
e um dia lembrada
em momentos de loucura e depressão.
E qualquer som, imagem ou perfume
que as tragam de volta
são apenas sensações da memória.
S.P. 16.3.83
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