viver e viver e sobreviver tão somente para contar
mesmo que o conto seja por metáforas da vida
mesmo que as lembranças sejam folhas esparsas
em versos às vezes insanos no escondido das palavras
mas um dia o calor das respostas de perguntas inúteis
invade o peito e arrebenta emoções de poços profundos
lembrar para reviver e não apenas contar os dias
ou apenas um momento de vidas convividas e divididas
edson fiorini um amigo que um jogo de bola levou tão jovem
iracema sidney pinto a irmã cujo sorriso iluminou tantas noites
lazarina gomes sidney a mãe que deixou o sulco mais profundo
samuel sidney pinto o irmão que me guiou os olhos pelos livros
vitório pereira resende o irmão que não tinha o mesmo sangue
augusto correa o filósofo das noites e madrugadas da juventude
valdir urbano o quase irmão que levava a alegria nas pernas
valter urbano o outro quase irmão que trazia circunspeção nos olhos
aparecida urbano a mater dolorosa a enfrentar o vazio da vida
damaso viegas nóbrega o cérebro que tinha um outro nome
josé geraldo danelon a elegância e a ética de uma vida equânime
chico de assis o mestre que amava e desconfiava do amor
e a lista iria adiante se quisesse lembrar todos eles e todas elas
se a vida parasse para chorar por todos eles e todas elas
então fiquemos a remoer-nos as próprias entranhas e choremos
choremos na quietude da noite cada noite cada momento
não há na vida quem não tenha os seus mortos na terra
mas só eu os tenho enterrados todos dentro do meu peito
sobrevividos todos a cada aceno de minhas lembranças
11.2.2019
(Ilustração: Hilda Goldwag,1912–2008)
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