28 de fev. de 2019

viver para contar






viver e viver e sobreviver tão somente para contar

mesmo que o conto seja por metáforas da vida

mesmo que as lembranças sejam folhas esparsas

em versos às vezes insanos no escondido das palavras

mas um dia o calor das respostas de perguntas inúteis

invade o peito e arrebenta emoções de poços profundos

lembrar para reviver e não apenas contar os dias

ou apenas um momento de vidas convividas e divididas

edson fiorini um amigo que um jogo de bola levou tão jovem

iracema sidney pinto a irmã cujo sorriso iluminou tantas noites

lazarina gomes sidney a mãe que deixou o sulco mais profundo

samuel sidney pinto o irmão que me guiou os olhos pelos livros

vitório pereira resende o irmão que não tinha o mesmo sangue

augusto correa o filósofo das noites e madrugadas da juventude

valdir urbano o quase irmão que levava a alegria nas pernas

valter urbano o outro quase irmão que trazia circunspeção nos olhos

aparecida urbano a mater dolorosa a enfrentar o vazio da vida

damaso viegas nóbrega o cérebro que tinha um outro nome

josé geraldo danelon a elegância e a ética de uma vida equânime

chico de assis o mestre que amava e desconfiava do amor

e a lista iria adiante se quisesse lembrar todos eles e todas elas

se a vida parasse para chorar por todos eles e todas elas

então fiquemos a remoer-nos as próprias entranhas e choremos

choremos na quietude da noite cada noite cada momento

não há na vida quem não tenha os seus mortos na terra

mas só eu os tenho enterrados todos dentro do meu peito

sobrevividos todos a cada aceno de minhas lembranças





11.2.2019 

(Ilustração: Hilda Goldwag,1912–2008)

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