a lua lá em cima
a gata cá embaixo
na rua a mulher
caminha tão nua
no campo o homem
engana sua fome
a lua que brilha
no olho da gata
a mulher que trilha
a trilha da caça
longe da mata
o cheiro de peixe
na mesa do chefe
espera-se que deixe
que a faca o espete
no meio da rua
na borda da lua
a gata caminha
a onça é a mulher
a mulher é a onça
a onça que vinha
cobrar o coleio
no cheiro da caça
o leite no seio
a brisa que passa
a fome do homem
a febre da gata
o pulo que cerca
o grito da noite
a chuva que chove
a troça na roça
o estouro do milho
no fundo da panela
um pé na janela
o chefe estrebucha
o sangue coagula
a gata se lambe
a onça não come
lua apagou
a mulher se vestiu
alguém se feriu
no passo da rua
ninguém sobreviveu
e a vida se fodeu
23.2.2020
(Ilustração: Antoine Wiertz;1806–1865; burial)
Nenhum comentário:
Postar um comentário