10 de set. de 2022

passeio pela ponte

 


meus passos e passeamos ambos pela ponte inconsútil

no ar o cheiro adocicado de sangue

minhas mãos passeiam pela tua pele no movimento inútil

que faz o coração no peito exangue

tuas mãos e arfamos ambos sobre a ponte os gestos trêfegos

do passante improvável aos teus e aos meus desejos

o cheiro de sangue não tem mais o doce perfume

que cabia nas pétalas de teus lábios e nos meus beijos

inconsútil o estranhamento somos o bordado tecido sobre os lençóis

neles refletem teus seios como a lua de loucos arrebóis

dançamos a dança da morte e da vida no meio do estrume

enquanto gemes os meus gemidos e calas os meus gritos

somos ambos passantes pela ponte inconsútil

equilibristas que a vida julgou e condenou como malditos

a caminhar entre as duas margens do orgasmo fútil

que liga as duas pontas do arco-íris dois seres aflitos

a buscar nos meandros de antigas palafitas

o equilíbrio das marés e do passo do bêbado sobre a ponte

sem esperança de encontrar na fímbria de qualquer horizonte

o fim de meus verdadeiros sofrimentos e de tuas falsas desditas



12.4.2022

 (Ilustração: Javier Arizabalo García)

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