23 de ago. de 2024

nós humanos

 




às vezes me pego pensando: o que sou?

quem eu sou?

indígena, preto, pardo, branco, amarelo, incolor?

olho-me no espelho: sou bonito ou sou feio?

tenho cabeça, tronco e membros – como todo ser humano

seja homem, mulher ou qualquer sexo,

seja preto, branco, amarelo, pardo, incolor, colorido.

penso, sonho, sorrio, choro, amo, odeio,

sou solidário às vezes

indiferente outras vezes

bonzinho ou maldoso, olho torto para umas pessoas,

olho com amor para outras e até mesmo com tesão

beijo, abraço, faço amor, como, bebo, tomo banho,

tenho pele, ossos, pelos, cabelos,

fico doente de vez em quando,

falo besteiras e também verdades

e só tenho uma certeza nesta vida: vou morrer

- infelizmente para mim, claro –

assim como todos os demais seres vivos que habitam

esse nobre e belo e instável e terrífico e tantas outras coisas mais

planeta

e nele vivemos todos e nele sonhamos todos e nele morremos todos

então quando penso no que eu sou ou quem eu sou

sei apenas que sou humano

e não sei por que – sendo todos humanos – nós que

pensamos, sonhamos, sorrimos e temos na cabeça um cérebro

e somos diferentes de todos os demais seres vivos deste planeta

onde há lugar para todos viverem

onde há lugar para todos sobreviverem

onde há lugar para todos conviverem

eu não sei e nunca saberei por que

precisamos matar uns aos outros

em nome de riscos no mapa [as fronteiras]

em nome de deus ou de deuses que nunca vimos

em nome de ideias e ideologias estúpidas e reducionistas

em nome de coisas tão estúpidas

quanto pretensas diferenças entre nós



nós – os seres humanos – que criamos e inventamos tantas coisas

tantas – que não cabem num poema

que não cabem num livro

que não cabem numa biblioteca

que não cabem em lugar algum

mas cabem em nosso cérebro

esse cérebro que pensa e sonha e cria

nós – os seres humanos – que temos esse cérebro

que é a máquina mais perfeita da natureza

nós – os seres humanos – ainda somos tão bárbaros

que ainda não criamos nem inventamos uma verdadeira civilização





2.11.2023

(Ilustração: Marc Chagall - le paradis)

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