Quando mergulho em teus cabelos
Quando mergulho em teus cabelos,
em busca de doce sonho,
cada vez mais me ponho
no centro de meus pesadelos.
No vórtice de ventos em vendavais,
meu ser torna-se pó, átomo e nada
e sou aquele que sofre mais
ao penetrar na caverna angustiada
de minha mente insana e vagabunda.
Monstros perdidos de priscas eras
mistérios criam e minha alma afunda,
presa em muros de densas heras
e florestas tropicais de retorcidos troncos,
transformada em mil pedaços de seres broncos
no primitivo ato do primeiro amor.
Olhos de cores várias, plissados de sangue,
refletem nas pupilas arregaladas
tormentos vis de minha alma exangue.
Raízes em abraços loucos entrelaçadas
revivem nos detalhes os meus tormentos:
são seres vivos moldados aos ventos
das eras em êxtase e agonias mil.
No céu plúmbeo e no mar de anil,
revoltas volutas de ventos vários
retorcem os raios do raro e róseo instante
em que meu ser, em luz vibrante,
quebrou todos os sagrados relicários
para nascer de novo em nova luz.
E minha alma não precisa mais daquele deus
que sofre em vão pregado à cruz,
pois enfim derramado o sangue dos filhos meus,
passo a ser eu mesmo a pregar o novo mundo.
Morre o símbolo, renasce a paz
no abismo de ser, no abismo mais profundo,
tudo o que era dor em dor se desfaz,
tudo o que era peso em névoa se transforma.
Não luto mais à procura de ti,
pois, alquimista de minha alma que se forma,
reencontrei no ouro dos teus cabelos tudo quanto já perdi.
(s/d)
(Ilustração: Picasso)
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