16 de ago. de 2010

POEMAS DE LOUCO AMAR - 24


Quero escrever à Neruda









Quero escrever à Neruda
toda a desesperança numa só canção.

Se mais de vinte poemas de amor te dediquei,
não há nenhum com a sonoridade trágica
da língua de Cervantes. Creio, no entanto,
que bastam no papel manchado as minhas lágrimas
e o sangue que brota de cada letra. Puedo
escribir los versos más tristes... Pensar
que no tengo. Sentir que la he perdido.
Mas não posso atingir com meus versos
teu coração fugidio, a tua alma em pedra transformada.

Caia sobre ti meu desejo para sempre adiado,
como a rocha sobre o mar,
caia sobre mim a noite mais que eterna
da saudade inesgotável a jorrar em cascatas
de meu pobre coração abandonado.

Não mais te quero, de tanto querer-te um dia,
não mais teus lábios sobre os meus lábios ansiosos,
não mais tuas mãos entre as minhas a tremer,
não mais teu corpo a vibrar de encanto e prazer,
não mais, ó doce esperança de um dia ainda seres minha.

Passe a vida, embora, a chamar por ti,
sei que estarás surda a meus lamentos.
Se sofres, não o digas, como digo a ti
em versos loucos todo o tormento de minha alma.

Eras única e disso não te apercebeste.
Eras minha e serás sempre minha, ainda que
teu corpo se esquive à minha paixão,
em sonho, em sonho, amada, és meu paraíso,
e do fogo que há bem dentro de ti,
ficará para sempre uma pequenina chama
de tudo quanto por ti me desesperei.
12.7.94

(Ilustração: Picasso)




FIM
DOS "POEMAS DE LOUCO AMAR"

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