25 de jan. de 2018

refúgio










refugio-me na ficção

romances

contos

poesias

encontro ali a humanidade

sem a premência do compromisso



erguidos os olhos

aquela dor ou aquela maldade

não contaminam meu sangue

como as dores e maldades

das páginas sangrentas dos matutinos

ou na voz compungida ou irônica

de âncoras da tevê com seu riso de plástico

gravata azul e cabelos arrumados de bonecas infláveis



a humanidade imaginada

compunge-me e confrange-me

mas não me destrói por dentro



as tramoias e os arrepdimentos

de um assassino russo

os lamentos de um corvo absurdo

os passos trêfegos da família Severina

as vinganças articuladas e empreendidas

a desesperança e a vitória diante da natureza

ou de condições adversas em planteta distante

tudo isso me comove e me revela

o ser que se diz humano

mas repito que

ao desviar os olhos são momentos que ficam

e não aporrinham o meu dia a dia

esse o refúgio desse despenhadeiro

de ódios

de lutas

de guerras

de bombas

de miséria

de mistificação

de exploração

e tantas outras desgraças

a que se submete o ser que se diz dono da Terra

mas que não é dono de seu próprio destino

abraçado a feitiços e demônios e deuses

que lhe corroem a vida por dentro e por fora




5.1.2018



(Ilustração: Francois Xavier Bricard -1881-1935 -; A Young Boy)




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