o poeta urinava na rua as pernas abertas o corpo
balançando um pouco o poeta nem dava conta
de que estava urinando na rua como um bêbado
e o poeta estava bêbado o pobre poeta urinando
na rua como um mendigo o seu pênis flácido
à sanha dos moralistas que o xingavam em vão
o poeta nem se dava conta de que estava na rua
a sua urina escorria pela calçada amarelando tudo
como amarela estava a sua alma perdida na tarde
o vagabundo que balança devagar o corpo mole
as calças rasgadas e o sapato furado pobre pobre
como sempre fora o poeta agora ali bêbado
a urinar na rua as suas rimas e os seus sonetos
que ninguém lia e ele vira motivo de zombaria
do bairro todo que nunca apreciou seus versos
e ele está urinando na rua como podia estar passeando
por bosques floridos cultivando suas musas loucas
seu ato não tem nada de desagravo e ele o faz
não porque deseja urinar na boca dos que não leram
seus versos talvez até ele quisesse mas não bêbado
talvez até fizesse isso num salão elegante quando
todos os seus não leitores estivessem perfumados
e dançando com suas mulheres decotadas e adúlteras
ele talvez até trepasse numa mesa e pusesse o pênis
para fora num longo mijo na boca daqueles idiotas
mas agora ali na rua como um pateta bêbado na rua
como um mendigo sem eira nem beira o poeta não
pensa em vingança nem nos burgueses que ele odeia
e que nunca deram importância a seus versos pobres
o poeta apenas urina para se aliviar de muita muita
bebida que tomara no bar da esquina para esquecer
amores esquecidos e vidas não vividas apenas isso
nada mais e é por isso apenas que o poeta urina na rua
13.12.2018
(Ilustração: Peter Brueghel the young - pissing at the moon)
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