21 de dez. de 2018

pobre poeta






o poeta urinava na rua as pernas abertas o corpo

balançando um pouco o poeta nem dava conta

de que estava urinando na rua como um bêbado

e o poeta estava bêbado o pobre poeta urinando

na rua como um mendigo o seu pênis flácido

à sanha dos moralistas que o xingavam em vão

o poeta nem se dava conta de que estava na rua

a sua urina escorria pela calçada amarelando tudo

como amarela estava a sua alma perdida na tarde

o vagabundo que balança devagar o corpo mole

as calças rasgadas e o sapato furado pobre pobre

como sempre fora o poeta agora ali bêbado

a urinar na rua as suas rimas e os seus sonetos

que ninguém lia e ele vira motivo de zombaria

do bairro todo que nunca apreciou seus versos

e ele está urinando na rua como podia estar passeando

por bosques floridos cultivando suas musas loucas

seu ato não tem nada de desagravo e ele o faz

não porque deseja urinar na boca dos que não leram

seus versos talvez até ele quisesse mas não bêbado

talvez até fizesse isso num salão elegante quando

todos os seus não leitores estivessem perfumados

e dançando com suas mulheres decotadas e adúlteras

ele talvez até trepasse numa mesa e pusesse o pênis

para fora num longo mijo na boca daqueles idiotas

mas agora ali na rua como um pateta bêbado na rua

como um mendigo sem eira nem beira o poeta não

pensa em vingança nem nos burgueses que ele odeia

e que nunca deram importância a seus versos pobres

o poeta apenas urina para se aliviar de muita muita

bebida que tomara no bar da esquina para esquecer

amores esquecidos e vidas não vividas apenas isso

nada mais e é por isso apenas que o poeta urina na rua





13.12.2018 

(Ilustração: Peter Brueghel the young - pissing at the moon)



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