31 de ago. de 2019

desabafo





de repente assim sem mais nem menos

como a praga de advérbios invadindo o poema

todas as desgraças do mundo se abateram sobre mim

de uma vida de sorrisos mais ou menos plenos

vi-me em dores no leito cheio de doenças

e não posso nem dançar uma valsa de strausss?

colocar para fora a porra do sentimento

de que o mundo conspira para me matar?

ora! que se fodam os que criticam

o sentimentalismo barato das desgraças pessoais

um ser humano tem sempre o seu direito

tanto de abusar de advérbios e de adjetivos quanto

de chutar o balde de merda de vez em quando

mesmo que não se compreenda

que essa merda toda caia sobre a própria cabeça

e assim de advérbio em advérbio coleciono

meus ais e angústias e que tudo mais se exploda

num poema de merda mal alinhavado no meio

da noite de pessimismo e desconforto

solto sim meu eu como solta o caçador o seu mastim

e saio à caça de mim e dos meus tormentos todos

e mando pro raio que os parta todos os escrúpulos

que de mim e só de mim e do meu eu

agora aqui nessa cama desolado e sofrendo

é que se trata afinal mais uma vez esse

merda de poema ou esse poema de merda 




5.8.2019

(Ilustração: escultura de Camille Claudel - a onda, 1903)

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