meu corpo é a casa onde moro
e é a única casa onde eu posso morar
tenho com o meu corpo uma relação
de antiguidade e de usufrutuário
não um contrato escrito
entre inquilino e locatário
mas há o consenso de que preciso
cuidar bem da casa e mantê-la
o melhor possível para que a convivência
seja amigável e eu não seja despejado
confesso no entanto que às vezes
tenho tomado atitudes impensadas
bebido um pouco demais ou ainda
feito besteiras pelas quais sou cobrado
confesso que uma ou outra vez
ultrapassei limites em busca do prazer
ou deixei meu corpo assim meio largado
mas nada de que possa me arrepender
ou que provocasse uma ação de despejo
porque tudo o que mais desejo
é que meu corpo não seja motivo
para desistir de nele viver
cuido dele o máximo que posso
há muito por exemplo deixei de fumar
há muito por exemplo que não tenho
bebido de ir por aí até cair num poço
modero atitudes que infrinjam regras
da boa convivência entre mim e meu corpo
modero atitudes que flagelem carnes e ossos
não tomo demasiados remédios e até faço
um pouco de ginástica para manter a forma
consulto a consciência a cada passo
para não pôr em risco a nossa relação
mas há algo que está acontecendo
entre mim e meu corpo que não entendo
algo no meu corpo que comigo mexeu
algo que reclamo e me deixa sem ação
é que ultimamente meu corpo envelheceu
muito mas muito mais do que eu
21.7.2019
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