tinha a orquestra 60 músicos – todos homens
uma orquestra filarmônica de machos jovens
de um país qualquer muito civilizado
mas uma orquestra – ironia do destino – original
com tantos machos e nenhuma mulher
uma boa orquestra como tantas outras
e essa orquestra um dia recebeu como convidada
uma solista oriental
uma jovem pianista genial
uma solista de piano jovem e bela e genial
e ela – a pianista oriental – bela e genial
apresentou-se ao concerto da noite trajando
trajando uma saia mais curta que o juízo somado
dos 60 músicos da orquestra filarmônica de machos
sentou-se ao piano e eram belas as suas coxas nuas
sentou-se ao piano como se sentasse numa nuvem
solta e bela e suave com aquelas coxas nuas
sentou-se ao piano e tocou como se estivesse no harlem
sentou-se ao piano e tocou a rapsódia azul do gershwin
tocou como se fosse a última virgem da terra
diante daqueles machos todos que tocavam seus instrumentos
com um olho na partitura e outro nas coxas nuas da pianista
e tocaram esses músicos a música de gershwin
como se fosse o último concerto que dariam na vida
como se tivesse a rapsódia azul todas as cores do arco-íris
tocaram como nunca antes haviam tocado
deixando transida a plateia e o maestro totalmente enlevado
tocaram como se cada um deles depois do concerto
fosse ter a suprema graça dos deuses
de poder despir a minissaia daquela pianista genial
e tocar e beijar as belas coxas da pianista oriental
29.6.2020
(Ilustração: Yuja Wang. Photograph: Ian Douglas)
(Você pode ouvir esse poema, na voz do autor, neste link de podcast:
Nenhum comentário:
Postar um comentário