16 de jul. de 2020

a pianista de minissaia







tinha a orquestra 60 músicos – todos homens

uma orquestra filarmônica de machos jovens

de um país qualquer muito civilizado

mas uma orquestra – ironia do destino – original

com tantos machos e nenhuma mulher

uma boa orquestra como tantas outras

e essa orquestra um dia recebeu como convidada

uma solista oriental

uma jovem pianista genial

uma solista de piano jovem e bela e genial

e ela – a pianista oriental – bela e genial

apresentou-se ao concerto da noite trajando

trajando uma saia mais curta que o juízo somado

dos 60 músicos da orquestra filarmônica de machos

sentou-se ao piano e eram belas as suas coxas nuas

sentou-se ao piano como se sentasse numa nuvem

solta e bela e suave com aquelas coxas nuas

sentou-se ao piano e tocou como se estivesse no harlem

sentou-se ao piano e tocou a rapsódia azul do gershwin

tocou como se fosse a última virgem da terra

diante daqueles machos todos que tocavam seus instrumentos

com um olho na partitura e outro nas coxas nuas da pianista

e tocaram esses músicos a música de gershwin

como se fosse o último concerto que dariam na vida

como se tivesse a rapsódia azul todas as cores do arco-íris

tocaram como nunca antes haviam tocado

deixando transida a plateia e o maestro totalmente enlevado

tocaram como se cada um deles depois do concerto

fosse ter a suprema graça dos deuses

de poder despir a minissaia daquela pianista genial

e tocar e beijar as belas coxas da pianista oriental

 

 



29.6.2020

(Ilustração: Yuja Wang. Photograph: Ian Douglas)


(Você pode ouvir esse poema, na voz do autor, neste link de podcast:

 

 


Nenhum comentário:

Postar um comentário