13 de out. de 2020

imaginação

 




há uma passagem estreita e escura

que me leva de dentro de mim

para o mundo enevoado da imaginação



quando a ultrapasso – e isso ocorre

muitas vezes ao dia – sei apenas

que caminho

não sei para onde vou

não há esmorecimento nesse caminhar

nem anseios por logo chegar

não há à frente nada que indique um porto ou destino

apenas o desconhecido a me espreitar e a me esperar

e ele está lá – o desconhecido –

sempre solidário e sempre atento aos meus passos

sempre um sorriso em seu rosto vazio

conhecemo-nos há tanto tempo

que não sei mais que cor ainda habita em seus olhos

entendemo-nos sem nos encarar

caminhamos juntos como caminharia um casal

por entre as flores de um roseiral

sou ele e ele a mim me pertence

e se não temos mais intimidade

do que estar um ao lado do outro

é porque somos o ser e a sombra ao sol

do mundo que criamos para nós

e um não precisa do outro ouvir a voz

para que os passos nos levem aos ignotos portos

onde desfazemos todos os nós

de nossos ancorados versos tortos

e damos asas aos nossos desejos que pareciam mortos 




14.5.2020

(Ilustração: Wols - Alfred Otto Wolfang Schulze - 1937)

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