velho envelhece e geme
geme e envelhece
e tudo quando teme
é um deus qualquer
não ouvir sua prece
e se o velho é mulher
além de rezar e tossir
só pensa nos filhos e netos
velhos e velhas
nunca são discretos
estão sempre a mentir
que está tudo bem
quando se sabe que têm
achaques e dores e reumatismos
saem lépidos e sozinhos
como se fossem jovenzinhos
e se trumbicam pelas calçadas
quebram braços e bacias
mas não baixam o facho
nem ficam por baixo
mantêm aceso o orgulho
para dar um sábio conselho
que não vale para nada
por que não há mais espelho
que o faça dar risada
quando anda pelas ruas
com três pernas ou andador
e se tu – jovem – insinuas
que ele vai depois sentir dor
reclamam todos de preconceito
que não assim tão antigos
que precisem ficar no leito
como se fossem pregos batidos
sem nada mais para fazer
e os velhos seguem na vida
como esperança perdida
sonhando sempre com o passado
lambendo cada dia uma ferida
26.11.2020
(Ilustração: Aleah Chapin, Seattle, Estados Unidos – 1986)
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