quanto mais negra a aurora a anunciar a tempestade
mais canta o poeta a esperança de que o raio ilumine
não a nuvem negra que empareda o tempo da tormenta
mas o caminho entre as montanhas por onde seguir cantando
mesmo que o vento traga apenas restos mortais de águas
pútridas (o anseio estilhaçado em pedaços de redes inúteis)
o peixe mergulha ao fundo do oceano a fugir do predador
e se mistura feliz entre os corais e os rochedos que o disfarçam
não cai o pássaro do ninho às bátegas de chuva se por acaso
passou todo o inverno a entretecer os fios e ramos
(arquiteto e operário num mesmo bater de asas solícitas)
e agora ensaia à chuva o canto de outros bicos protegidos
assim vive a esperança ao canto às vezes inútil do poeta
assim caminham todos os que baqueiam embora e se levantam
e o tempo amarga cada pegada que na montanha deixam os pés
enrugados e feridos a galgar o lento caminho sempre para o alto
13.6.2018
(Ilustração: Luis Ricardo Falero)
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