vida útil x vida inútil
neste jogo só perde quem não joga
vida útil x vida inútil
o placar de zero a zero indica que o jogo
vai começar e que entrem os contendores
pela vida útil
o carimbo na poesia
os tijolos suspensos no ar
o vomitório na cama de ferro
o lírio murcho entre as coxas
o veneno nos escapamentos
os estertores nos cemitérios
o rio roxo coberto de fuligem
o campo minado
o brejo dos dólares de tio sam
o espanto dos urubus
o grito dos desesperados
pela vida inútil
a rosa branca no fundo do jardim
a sonata ao piano no meio da noite
a sensação de formigamento no ventre
as pernas que balançam no abismo
a gota de luz na testa do atleta
a esperança (mesmo que pouca) do poeta
a bola que rola nos sonhos infantis
a virada do vento no fim da tarde
a língua ferina da vênus de milo
a risada franca no alto da montanha
a silenciosa passagem da lua
façam suas apostas senhoras e senhores
façam suas apostas mesmo que saibam que
nenhuma ficha será paga a nenhum ganhador
o crupiê arrecada de todos e a roleta roda sem parar
sofram ou sorriam
abracem-se e beijem-se
ou esmurrem-se até o knock-out
seus gritos de nada valerão
seus sonhos serão torrados em fogueiras de vaidades
seus anseios ficarão pendentes dos lustres de cristais
e serão vendidos a prestação em liquidações e leilões
será tão útil para a vitória de seus números malditos
quanto será inútil para a derrota de seus altares
toda a mandinga que fizerem ao redor do eixo da terra
e a vida sempre celebrará (ainda que nos túmulos cerrados)
a vitória e somente a vitória de genes e moléculas
vida útil x vida inútil [horizonte apenas horizonte]
5.9.2018
(Ilustração: esc. de Maria Martins - O-Impossivel;
foto de autoria não identificada)
Nenhum comentário:
Postar um comentário