10 de out. de 2018

jogo da vida





vida útil x vida inútil

neste jogo só perde quem não joga

vida útil x vida inútil

o placar de zero a zero indica que o jogo

vai começar e que entrem os contendores



pela vida útil

o carimbo na poesia

os tijolos suspensos no ar

o vomitório na cama de ferro

o lírio murcho entre as coxas

o veneno nos escapamentos

os estertores nos cemitérios

o rio roxo coberto de fuligem

o campo minado

o brejo dos dólares de tio sam

o espanto dos urubus

o grito dos desesperados



pela vida inútil

a rosa branca no fundo do jardim

a sonata ao piano no meio da noite

a sensação de formigamento no ventre

as pernas que balançam no abismo

a gota de luz na testa do atleta

a esperança (mesmo que pouca) do poeta

a bola que rola nos sonhos infantis

a virada do vento no fim da tarde

a língua ferina da vênus de milo

a risada franca no alto da montanha

a silenciosa passagem da lua



façam suas apostas senhoras e senhores

façam suas apostas mesmo que saibam que

nenhuma ficha será paga a nenhum ganhador

o crupiê arrecada de todos e a roleta roda sem parar

sofram ou sorriam

abracem-se e beijem-se

ou esmurrem-se até o knock-out

seus gritos de nada valerão

seus sonhos serão torrados em fogueiras de vaidades

seus anseios ficarão pendentes dos lustres de cristais

e serão vendidos a prestação em liquidações e leilões

será tão útil para a vitória de seus números malditos

quanto será inútil para a derrota de seus altares

toda a mandinga que fizerem ao redor do eixo da terra

e a vida sempre celebrará (ainda que nos túmulos cerrados)

a vitória e somente a vitória de genes e moléculas

vida útil x vida inútil [horizonte apenas horizonte]





5.9.2018


(Ilustração: esc. de Maria Martins - O-Impossivel; 
foto de autoria não identificada) 



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