stalin plantou uma árvore
cujos frutos estavam podres
regamos sim essa árvore
por um tempo demasiado
porque não víamos seus frutos podres
ofuscados pelo sol da ideologia
não foi a ideologia que frutificara
fora o coração podre de stalin
que fizera nascer essa árvore
de frutos podres
o sol cegara com ideologia
os nossos olhos
não plantou nenhuma árvore
no coração de marx
os pobres do mundo continuam
comendo as raízes do capitalismo
sem noção do fruto dourado
que é mais podre que os frutos podres da árvore de stalin
os campos de soja destroem florestas
porque dizem que tu precisas comer
e o gado come o ouro de wal street
porque dizem que tu precisas viver
nós os ex-stalinistas cagamos solenemente
nos salões de governos dos ditadores
se confessamos os crimes que não cometemos
é porque deixamos nossos fígados dependurados
nos paus-de-arara dos quepes verdes
porque não batíamos continência para beócios
não há saída para o pensamento
que não seja o raio de luar em noites negras
há nos palácios de todos os governos
quartos escuros e escuras intenções
não nos cabe a nós
- os ideólogos da nova terra –
exorcizar demônios que não criamos
- aliás aqui entre nós
nunca acreditamos nos demônios –
também não acreditamos nos deuses
e se queimamos os seus altares
é porque a vida vale ser vivida e não querelada
seja o espanto de cada um de nós a nossa estrada
seja o vento de cada mudança o nosso norte
somos todos uns loucos da lua cheia
a esconder nos esconsos das galeras dos piratas
o tesouro de nosso desespero
no histerismo freudiano de nossos sonhos
determinismos explodem a cada passo
sabemos o que queremos
nem sempre queremos o que sabemos
no chão podre de fábricas de computadores
há mais pedras lapidadas no passado
do que imaginou qualquer poeta
se gritamos o nosso urro pelas ruas
somos apenas pó de estrela
à procura de um destino
que se sacrifiquem novos cristos
não deveria ser problema nosso
mas o grito do passado ainda ecoa
chega de sangue
chega de pregos
chega de gólgotas
a esperança está no capim da estrada
não está na sandália do abandonado
não há pai
não há mãe
os filhos da pátria são todos filhos gerados in vitro
ou clonados do sangue dos conquistadores
césares e alexandres pululam pelos campos
em busca de nossa jugular
enquanto ainda hitler gargalha entre os vermes
o vento da dor a todos arrepia
ou você luta ou você caga
se o caminho de flores nascer sobre as fezes
e sobre o sangue de quem aceitou a lei do chicote
a lei deles escurecerá o mundo
caiba a cada novo membro da nova seita
ser o sol que esturrique o verme
no coração de stalin não há mais sangue
que no coração dos plantadores de cadáveres
enquanto berra o cordeiro de deus
bebem teu sangue os magnatas da quinta avenida
e de todas as quintas partes de tua vida
que eles expropriam enquanto és o escravo do mercado
sobre os teus ossos o mar em ondas
renasce em flores de pedra e gelo
e desse cabedal és tu o chão em que pisam
não terás nunca em tuas mãos o teu próprio destino
se o entregas aos cães que ladram na noite
e buscam tuas carnes ou cheiram tuas entranhas
teus desertos mentais deixam aos monstros
os restos de orgias dolarizadas em bolsas do mundo inteiro
o papel picado que eles jogam pelas janelas
nas festas de réveillon são as tuas tripas
e cada célula do teu corpo tem dono
formas as fileiras sob as botas que batem
no asfalto do poder a marcha dos famintos
não é tua fome que alimenta o monstro
não é teu grito de dor que provoca orgasmos
a máquina que move o mundo
tem no teu olhar para o futuro
a energia de sóis e de bombas atômicas
para manter teu espanto
e comer a cada dia um pouco do teu sonho
e é de teu sonho que ela – a máquina –
se alimenta e se constrói
esquece stalin – ele está morto há tantos milênios
quanto o teu silêncio diante do destino que traçam para ti
25.5.2020
(Ilustração: escultura de Kris Kuski)
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