tantas vezes se morre pela vida afora
que a morte quando na verdade chega
só traz surpresa porque é ela que implora
o nosso perdão por ser assim tão cega
a colher vidas que afloram por instantes
luzes de pirilampos em noites escuras
às tontas pelos caminhos e pelas fissuras
das rochas e das montanhas distantes
sopros de vento a apagar velas nas sepulturas
quando deviam ter caminhado um pouco mais
porém não há desculpas para os sobreviventes
que acordam cada manhã como se fosse a vida
um contínuo sem fim sem dor e sem doentes
vórtice de galáxias num sonho sem guarida
a iludir a si mesmos pensando que a velha trapeira
deles se esqueceu e que portanto sobreviverão
ah pobres dementes a rir à toa pelas proas
sem saber que gargalham da própria doideira
navegantes que viajam na classe de primeira
esperando de alguma estrela guia a salvação
ignorantes que por isso serão os primeiros
a serem enxotados e jogados como embusteiros
do navio fantasma da vida no mais fétido porão
17.11.2019
(Ilustração:Antoine Caron - 1521-1599 -
Les funérailles de l'Amour)
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