às luzes do bordel a carne velha ganha uma nova data de validade
bocas enfaradas saciam o gosto milenar do predador pela vítima putrefata
os ratos passeiam pela orquestra que muge tangos improváveis
há nas paredes papéis cobertos de musgos e flores abissais
o desejo arrepia a carapaça da cabeça de crocodilos e dinossauros
pensam-se penas penadas em pelagens de ornitorrincos
num teatro de sombras e anseios jamais concretizados
a carne disposta em ganchos de dentes podres balança ao som
do piano quebrado num canto redondo do espelho de vidros coloridos
o vento de ventiladores inexistentes ferve os miolos e aquece
corações partidos e emendados pelos eflúvios de alcaloides
corre o ópio em veias e velhos horizontes que se desdobram
em cantos oníricos de prazeres que se frustram a cada mordida
nos ossos que restam sobre as mesas podres que se partem
em triângulos amorosos desviados de suas origens sujas
as luzes do bordel não se apagam jamais e o espetáculo
de todos os teus sonhos mortos perdura pelas paredes
e escorre para a calçada na lavagem matinal dos gritos
e sussurros que ficaram grudados como chiclete
nos úmidos desvãos da memória e do espanto às luzes
que nunca se apagam do velho bordel de carnes podres
9.3.2018
(Ilustração: escultura de Kris Kuski, The Deadly Sins)
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