"Quem combate monstruosidades deve cuidar para que não se torne um monstro.
E se você
olhar longamente para um abismo, o abismo também olha para dentro de
você."
(Nietzsche)
tenho olhado tantas vezes para o abismo
que já nem percebo que ele me olha também
ou que talvez já nem me olhe porquanto
sou eu o próprio abismo de mim mesmo
e se me olho e vejo o abismo é porque
não sei mais se sou eu que me olho
ou se é ele mesmo - o abismo - a me olhar
de forma não menos surpreendente
sei apenas que dentro de mim mora
um monstro que não mitiga minhas dores
não paga as minhas contas nem desconta
a desdita de viver apenas e não mais sonhar
que esse monstro – que sou eu mesmo –
exaure dos meus abismos a coragem
suga os ventos de vida que ainda sopram
e afaga a memória não de um mas de todos
os demais monstros que ainda habitam
no interior de meu ser em revolução
sou eu um vulcão aparentemente extinto
que ruge e não explode porque o abismo
- também ele um vulcão sem fogo e lavas -
destrói cada esperança que a mente expele
para estrelas que brilham distantes
distantes demais para se alcançarem
sem que o abismo que em mim habita
apague com fogo o fogo de ainda viver
17.9.2018
18.4.2024
(Ilustração: Caspar David Friedrich)
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