em janeiro de dois mil e dezessete eu completei
setenta e dois anos de idade e pensei comigo
basta
nada mais de aniversários
nada mais de envelhecer
que eu viva mais dez ou doze ou vinte
ou sei lá quantos mais anos
que eu morra aos setenta e dois anos
e hoje quando mais de ano passado
continuo com setenta e dois anos de idade
e assim continuarei para sempre
e alguém pode até contrapor
por que não paraste aos vinte e sete por exemplo
quando estavas no auge da mocidade
ou pelo menos na maior completude da vida
quando tinhas ainda tantos sonhos a sonhar
tantas vidas a viver
ora digo eu porque aos vinte e sete ou outra
qualquer idade abaixo dos setenta e dois
não teria nenhuma completude porque isso
de estar completo ou exuberante ou jovem
nada tem a ver com a vida vivida e experimentada
aos setenta e dois sou a mais plena incompletude
apesar de tudo quanto tenha vivido ou experimentado
e assim talvez um velho de cabelos brancos eu possa
ao me olhar ao espelho pensar que nada mais
nem de menos se possa esperar de surpresas ou
desencantos e que eu tenha a quietude do regato
ou a placidez dos lagos ou até mesmo a sabedoria
dos animais que vivem apenas sem pensar no futuro
que aos vinte e sete seria o motivo do meu envelhecimento
não tenho mais o que envelhecer e como estou
posso permanecer ao relento à chuva ao sol ao vento
que a pele curtida não tem mais por que se trocar
por células novas que de novo se renovam e eu
um velho não velho um jovem sem ser jovem
permaneço com meu sorriso tranquilo ou não
mas sem qualquer esperança que impeça
que eu sonhe os sonhos mais impossíveis que
nenhum jovem de qualquer idade ousaria sonhar
30.8.2018
(Ilustração: Luis Ricardo Falero)
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