22 de abr. de 2020

medos




passeia o meu medo pelas ruas frias

nas tortas madrugadas de lua nova

quando meus passos tu conduzias

o olho atento em busca de prova

passeia levando pelas mãos geladas

anseios de fantasmas e almas penadas

no canto de muros e nos altos cimos

de árvores curvadas à chuva e ao vento

escorregam-se meus passos nos limos

das pedras por onde caminho e tento

ver nas trevas o teu medo no meu

assim passeamos ambos pelo breu

de muitas noites agora mais mortas

que a curva sinistra das ruas tortas

tu meu amigo e parceiro de medos

arrepias-te da sombra e dos vultos

transformas teu susto em cultos

não há mais que nossos segredos

agora para sempre na noite ocultos

e emparedados como os fantasmas

que saem de nós como miasmas

só o teu medo e os nossos desejos

cabem agora nos passos tortos

somos nós os nossos ensejos

eu e tu - tu e eu - ambos mortos






8.4.2020

(Ilustração: Eric Lacombe - dark abstract portraits)







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