Ruas estreitas de minha aldeia
cobertas de pedra e areia,
chão rasgado por passos
de pés nus sem esperança,
procissão de dor e lembrança
a abrir o tempo em busca de espaços,
ruas e becos sem saída,
contidos por voçorocas e rios:
na terra aberta lenta ferida
renova da natureza todos os cios;
sobre o vento passam fantasmas,
sob a areia ficam os passos,
sobem ou descem da neblina os miasmas,
de rostos antigos delineiam-se os traços;
dos becos à luz da lua
retorna do futuro que não há
a imagem do passado que flutua
à brisa que um dia soprará;
na praça a sombra da tipuana
tece nas pedras do chão o bailado
de toda a desesperança humana
e ao fundo o velho sobrado
revive os sonhos do passado;
no sobe e desce dos caminhos
outrora no ouro adormecidos
onde púrpuras, sedas e arminhos
o orgulho traziam revestidos,
o pobre chão de terra batida
mostra entre pedras e espinhos
douradas cicatrizes de uma só ferida
aberta à lenta cobiça do tempo
às sombras, aos reis, ao pobre
sepulturas de flores e vento
que a poeira dos passos não cobre.
Ruas, ruas, ruas de aldeia
por onde o passado passeia
sob rios de ouro e de areia!
27.4.92
(Ilustração: foto de Lavras antiga - praça Dr. Jorge)
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