31 de dez. de 2020

pedra de lua

 





inexplicável a montanha ante meus olhos

envolta em bruma envolta em luar

inalcançáveis talvez aos olhos nascentes

as trilhas para seus altos relevos

ferem meus passos no passo lento

vou em busca de mim

vou em busca de ti

nasço em cada horizonte e em cada pedra

peço lua para meus passos e peço sol para os meus olhos

e a bruma envolve meus desejos



há esperança na subida

não há esperança na chegada

apenas o lento caminhar

apenas o arfar do peito já cansado



o querosene queima na lamparina

o menino lê

desenlaça da fuligem poemas que não escrevi

quando a esperança se enrosca num teto podre

só restam as palavras

e os poemas dançam liturgias que matam a fome

há fuligem no teto como há fuligem hoje nos meus passos

ando descalço pelas pedras rotas de ruas tortas

a pipa arrebenta a linha e desaparece ao vento

sonhar é possível e os sonhos são a vida

ou são apenas sonhos como disse um poeta

seca ao sol o sangue dos pés que fica nos veios das pedras

mas o sangue das memórias que pinga no coração

deixa a marca de fantasmas de outrora no sonho de agora



ouço o cantar de sabiás e o ruflar de asas de colibris

os ouvidos ouvem - eles ouvem

o coração segue mudo e incandescente ao luar

sonho contigo menino de pés feridos nos espinhos do ora-pro-nobis

sonho contigo e compreendo hoje o teu lento despertar

ouvias os poetas e não as estrelas até que um dia as estrelas

capturaram para sempre o teu olhar

e agora a montanha está no horizonte indelével

pluma de pipa ou pipa ao vento ou pedra de lua



hás de seguir as estrelas mesmo que não haja

mais estrelas na noite de bruma

vejo a janela semiaberta ao olho curioso

e tu sabes menino de coração mole

que esse olho olha apenas por olhar

não te olha por te amar

sobes às árvores para cantar como os pássaros

mas tuas asas ainda não se cobriram de penas

e o voar é sonho que a montanha enovela em nuvens

o jogo rola e rolam bolinhas coloridas na terra vermelha

o lápis roto copia as letras redondas da cartilha

o índio da capa leva às costas um curumim

e o futuro improvável e sonhado de um país





árvores e pedras

riachos e cachoeiras

mangas e jabuticabas

os caminhos agora levam ao morro não à montanha

a água corre e leva lágrimas e o esperma ralo

na tua [minha] noite de espreitas e suspeitas

há sonhos vagos de virgens na brancura dos lençóis

vento e gritos povoam pulos e perseguem pintassilgos

a tarde se esboroa em torno do campinho vermelho

e a bola de fogo do sol faz mais um gol atrás do barranco

o fogão a lenha esquenta a sopa e a mãe mata o escorpião

tua perna arde ao fogo da brincadeira estúpida

e o trenzinho de caixa de fósforos deixa trilhas de dor

nas tuas longas noites de fogueiras perdidas



adormeces sob estrelas e acordas na noite de fogos

uma tempestade na madrugada e o medo e há também

um grilo que se esgoela sob as tábuas do assoalho

da caixinha de linhas da irmã nascem cisnes numa toalha

a máquina singer sussurra vestidos floridos

na transmissão contínua de suas rodas e roldanas

a vida costurando tramas e enredos

cerzindo buracos de saudade

e cobrindo de cores botões esmaltados de desejos



a noite é negra e quieta quando não há histórias de fantasmas

o grupo escolar tem cheiro de borracha e tinta

e cheiro de algazarra e puxão de orelhas

ano primeiro no velho grupo o teu amigo para sempre

o amigo da carteira ao lado e do lado esquerdo do teu peito

onde ficam para sempre as amizades

como cantou um dia o molequinho de três pontas

que quebrou as esquinas do mundo com sua música

o velho grupo escolar – o teu velho grupo escolar

lembra aquela menina negra de tranças

tão distraída em suas lições que perdeu o lápis

nas tranças negras e a sala inteira procurava

e aquela outra menina por quem teus olhos se encantaram

ah o meu velho grupo escolar

tu estás agora no alto da escadaria e todos olham para ti

lês um discurso menino sem jaça o primeiro talvez o único

teus joelhos tremem e tua voz é a voz do curumim

e o curumim olha a montanha inefável e vai embora

tu tiveste um amigo curumim e com ele folgaste

pelas tardes e pelas noites de cantigas e pique-esconde

perdeu-se em belos horizontes teu amigo índio

perdeu-se para sempre e deixou em ti o rastro

de todos os curumins e de todas as risadas de rio

a praça ainda está lá e não é mais a mesma em seu mutismo



vai mais além no teu caminho grita a coruja ao fim da curva

sim vou sim vou sim eu respondo – tu respondes –

e meu pé - o teu pé – descalço arde na pedra

sombrio o tempo que não percebeste

de pouco pão e muito sibilar das rodas da singer

aos pés da tua mãe noite e dia noite e dia

o pai passado para pátrio poder de outras possibilidades

só o irmão que morava na cidade do morro de três picos

só o irmão que foi o teu pai mais que o pai muito mais

não te esqueças nunca menino de calças curtas

não te esqueçam momentos como raios

momentos como traços de luz



no bico do pássaro o fruto proibido

a porta da fábrica de tecidos

a fábrica a tecer as mãos hábeis

da irmã que bordava – o prédio oval

tu gritas murcha cadela e a sensitiva

ao contato de teus dedos murchava

quanto murcharam depois os anos

a negra bonachona enche a marmita

o cheiro do bife e do arroz com feijão

tantos momentos longos apertados no passo dos pés

que sobem o caminho da montanha

os trilhos lerdos levam o bonde ladeira acima

tilintam campainhas na minha memória

- tu és eu ou sou tu? – não chores menino

sempre há vento em agosto

sempre há festa e jogos nos campos do colégio dos ricos

e meninas bonitas que não se podem namorar



uma vez a noite se encheu de trinos

e a voz do tenor italiano rompeu as paredes do velho auditório

que um dia também recebeu o concerto do jovem pianista que correu o mundo

há frio e lua nas cordas dos violões em serenata

e a canção do adeus agarra-se às folhas das buganvílias



ouve o teu coração menino carente

deixa a angústia de agora para o cimo da montanha

teus amores todos te abandonaram

e a cidade grande comeu teus desejos

calçarás um dia os sapatos que agora te faltam

e serás infeliz assim como todos os que dormem

em lençóis de cetins e travesseiros de penas de ganso

goza agora a tua liberdade menino de nariz sujo

mesmo que as pedras das ruas tortas mordam teus pés



uma caneta tinteiro te fez príncipe e teu amigo invisível

não te conta mais histórias da carochinha

uma garota nua sai de detrás da pedra

o teu primeiro deslumbramento veio do frio do norte

- esconde rápido essa revista menino – esconde

teus olhos piscam – o pecado pisca – o capeta pisca

há cheiro de velas no ar e o altar esplende em rezas

tua mãe se curva com o véu negro da fé

e os missionários tilintam terços negros na noite de esconjuros

a fé não moveu tua montanha e ela está lá – impenetrável



duas aranhas negras se engalfinham aos teus olhos atentos

o mandacaru escancara flores brancas na noite de lua

e o rádio traz notícias da morte do presidente

a criançada espalha-se pela praça pulando a alegria

das aulas suspensas e encontra o cenho carregado dos adultos

o luto está acima de todas as tuas suspeitas – menino liberto

o canto do bem-te-vi não te comove se bica a manga mais amarela

o pôr do sol atrás do morro traz apenas sopa e sono e sonhos

a mãe canta uma canção de tristeza e a noite cai ao peso

do edredom colorido feito de sobras de tecido

tecidos inteiros que passeiam que bailam que viajam

nos corpos interditos vestidos pelas rodas da singer



quando os ponteiros se encontram voltados para o infinito

boa noite amor meu grande amor – canta o cantor ao meio-dia

um rei que morre depois de cantar para todas as crianças

ferve a água para o angu doce

o leite sobe na leiteira e a mãe coa a nata para o pão

o pão de sal com café ralo e doce de carinho de mãe

o gato ronrona entre tuas pernas

o jogo de botão tem lances de copa do mundo

o tempo flui nas florações do manacá

dançam as horas no relógio de parede da casa da tia

corre cotia corre a tia costura o tio os sapatos

cheiro de cola que cola no pelo do gato no teu colo

bota o retrato do velho bota no mesmo lugar

mas o velho se matou e não houve aulas

um cavalo tem uma estrela na testa

cavalga na noite de lua cheia

agosto de novo e a festa e as meninas bonitas na arquibancada

enquanto rola a bola ou voam corpos pelos ares

sonha-se a possibilidade de entrever de uma descuidada

sob a transparência de uma calcinha branca

a sombra negra de um desejo que não sabes bem o que é

e levas para a noite sonhos e temores desconhecidos

que molham tuas pernas



o cristo morto cruza as ruas ao som da matraca

e então a voz da verônica ecoa e o rosto crucificado

tem a tristeza de todas as tardes sem futuro

no meio da redondez da lua nos passos porosos pelos paralelepípedos

soldados romanos marcham marcados passos ao som de tambores

passa a procissão pelos teus olhos de pecador e agora

bandeirinhas tremulam ao dobrado da banda militar

o setedesetembro é apenas pés que pisam com força a pedra da rua

a cidade é longa como o ventre da baleia que engoliu jonas

bebes a foto do papa na revista – um rei sobre um trono suspenso

baba o papa mas sua baba ainda não tem a cor do sangue judeu

tu já sabes ler – menino endiabrado – e um santo louco

abre para ti as portas do seminário de noites solitárias

e tu lês a revista católica da mãe e as revistas de fofocas da cunhada

geme baixinho o filho doente do teu irmão e ele mata o pintassilgo

cantava enquanto o menino parecia morrer

passou a morte e não levou o menino

levou apenas as penas do passarinho



um dia é igual a uma noite e uma noite é igual a um dia

na melopeia do canto do grilo ou do canto da missa do galo

a vida tem o tamanho da mangueira e a inexpugnabilidade

do abacateiro – no quintal um dia um tatu

alguém o matou e hoje tu choras o pedaço de carne que comeste

e também um ouriço na ameixeira e patos e galos e galinhas

há instantes que não passam porque o tempo parou ali

e teus olhos espreitam fantasmas e inventam sombras

as paredes rachadas de uma casa velha escondem sonhos

e o sopro de vida que pode apagar-se à brisa da tarde

cães que ladram para a lua e a lua que ladra para ti

sombras apenas sombras povoam tuas lembranças

uma flor no balcão da varanda da casa da menina todas as noites

e o amor que bate no dedão do pé e arrepia teus cabelos

há uma foto de primeira comunhão de que tu não te lembras

mas vivem os versos de camões do livro que teu padrinho te deu

no dia de tua formatura e teu irmão te disse que um dia

tu serias homem para que ele te desse uma surra

- ele nunca te bateu – e a surra doeu para sempre

memórias breves e sutis perpassam sob tuas pupilas cansadas

há esperança no passado – não há esperança no presente –

não semeias mais esperança de futuro – o tempo

esgota-se na memória o tempo do sonhar e o tempo do viver

a liberdade nas águas da cachoeira e no lambari que se esconde

atrás da pedra há um olho que olha e te diz que o mundo

escorre como a água do riacho para o rio e do rio para o mar

não chores – menino de águas noturnas – não te esperam

ainda os espinhos dos caminhos e tens apenas teus olhos

para descobrir a inefável trilha da montanha

não chores ainda que a vida é apenas a bola

que não entrou no gol e o gol que não viste nem comemoraste



sobe a rua torta – menino – sobe e ouve o piano

é música dos salões que nunca pisarás – dos salões da burguesa gente

ouve apenas que ela – a música – é tudo quanto terás

o caminho para o alto da montanha pontilha notas de sonatas

e os teus pés tropeçam a cada pedregulho que rola abaixo

tens apenas tuas palavras e tua imaginação para voar

e voarás apenas na imaginação das tuas palavras

- menino de sonhos ineficazes – menino de uma cidade encoberta



acordo a minha infância

adormecida em berço de folha seca e solidão

correr de novo a praça de árvores de copas redondas

esconder meu sonho atrás de ciprestes que exalam

o odor da note sem lua

saias que giram ao canto lento

ciranda cirandinha

o cravo a rosa o espinho

a sofreguidão da vida que nasce e renasce

o suspiro estagnado na garganta

os mocinhos matadores de índios que pulam das capas de revistas

cowboy de papel colorido que o tempo redesenhou

o filme proibido na tela do cinema de poltronas de madeira

e gritos da plateia quando a mocinha aparecia quase nua

um balão que não cai nunca na rua do sabão

a jabuticabeira enlouquecida de frutos negros

e o espanto do cão ao provar a jabuticaba – era sua fruta proibida

e ele não sabia – depois passou mal

um paraíso de lata e papelão e mandacaru – o laboratório

misturas estranhas e estranhos cheiros em vidros coloridos

trilhas no mato uma pele esquecida de cobra

e a falsa coral esgueirando-se rápida ao arrepio dos passos

noites longas de chuva e frio

a tosse do avô no quarto ao lado

o cheiro de fumo de seu cigarro de palha

o mundo mínimo de formigas em paus podres

o cheiro do café quente escorrendo no coador

a lenha que crepita e aquece no fogão um pedaço de lua

que teima em espiar pela fresta da porta de madeira velha



esfumam-se os olhos negros nas névoas de junho

distante o som de um piano na noite

só a imaginação do menino as figuras que dançam e bebem e conversam

a aurora de loucos sonhos desmanchada pela hora de ir para a escola

uma pedra filosofal

um veio de ouro

no barranco mágico o colorido da terra e da argila

o vento de âmbar ao som da singer

roda o destino ao corno da lua

cores da noite

cores do dia

o jogo jogado numa só esperança

a semente do homem nos olhos do menino – eu?

de novo os olhos negros no negrume da noite

a janela iluminada ao badalar do relógio de pêndulo

noites de lua e versos

noites de busca da rima que não vem

que não vem

que não vem

e esfuma-se o poema na letra de forma

o menino – eu? – pensa a poesia

a poesia que voa nas asas dos sanhaços

manga madura ao sol da tarde – sol e manga amarelos como a esperança

a esperança que pisa os caminhos tortos

na trilha do cabelo repartido ao meio no alto da cabeça

o gosto de trigo da hóstia que se dissolve na boca

os pecados todos peneirados na tela negra

que separa a voz da salvação do olhar do pecador

os joelhos ralados no genuflexório

promessas que nunca serão cumpridas

no sonho mau das noites de espera

sonhos quebrados e alquebrados nas quebradas do morro

a lenta e leve poeira de ouro do fim da tarde

o ouro do sol contra o azul do céu

sombra que prevalece no verde dançante das folhas de bananeira

haverá sempre estrelas nos olhos do menino

haverá sempre estrelas nos meus olhos

estejamos ambos – eu e o menino –

(e já não sei mais se sou eu o menino ou se o menino sou eu)

rumando ou não a passos trêfegos para o alto da montanha

porque a montanha – sei eu agora o que sempre soube o menino –

representa o que todos dizem ser a metáfora da própria vida

inalcansavelmente inexplicável

inexplicavelmente inalcançável

a montanha ante meus olhos

envolta em bruma envolta em luar

inalcançáveis talvez aos olhos nascentes

as trilhas para seus altos relevos

ferem meus passos no passo lento

inexplicáveis – tolamente inexplicáveis -

as pedras – as pedras – a pedra de lua






26.6.2020

Ouça esse poema, na voz do autor, Isaias Edson Sidney, neste endereço:

29 de dez. de 2020

pássaro capturado

 




no arvoredo a passarada

estilhaça o silêncio

quando surge a madrugada 

em segredo o teu orgasmo

vem e passa como onda

arrasa tudo não deixa nada

no silêncio da madrugada

sou pássaro de asa quebrada

de teu silêncio prisioneiro

predador na rede caído

sem rumo e sem cruzeiro

abortado em teu espasmo

o peito em dores dividido

abraçado no teu abraço

despejado do teu orgasmo



25.8.2020 

(Ilustração: escultura de Clodion - 
The Intoxication of Wine, ca. 1780–1790)




 

 

27 de dez. de 2020

para célia m. de j. m.

 




um dia você dançou nua

para mim

pisavam os seus pés as nuvens

a me levar para a lua

seus passos ao som de day dream

nossa música – de uma banda de rock

vinda de um país gelado –

para afoguear nossos orgasmos

no leve toque

de meus lábios em teus seios

teu cisne a morrer em espasmos

no abismo de teus olhos



oh célia – éramos jovens e loucos

e os momentos pareciam – e foram – tão poucos

para os nossos enlaces

às vezes noite

às vezes dia

eu e você – você e eu –

- tu e eu – eu e tu apenas

naquele pequeno apartamento

em que cabia

todo o nosso encantamento



teu corpo nu a dançar como as falenas

e eu a beber dos teus encantos



agora – depois de anos tantos

– relembro o teu sabor –

- teu passo preciso –

- teu ventre liso –

sinto de novo o calor

de teus beijos

de nossos desejos

sem poder nem imaginar onde estás



sim – minha querida – teus passos de dança

teu corpo nu e tu própria – era tudo esperança

era tudo naquele instante toda a minha paz



28.8.2020

(Ilustração: escultura de Léonildo Giannoni)

25 de dez. de 2020

para aldir blanc

 





quando um dia o teu bêbado

cruzou com o bailado oculto da minha vida

não sei se estava bêbado

sei que era eu a bailarina

na corda bamba

troçando e trocando passos

pelos fios invisíveis do destino

dancei contigo pelos bailes da vida

dois pra lá

dois pra cá

muitos para lado nenhum

desenhando letras nas lousas negras

sem nunca pensar que estavas lá

sem nunca pensar que eras parceiro

mas era tua a sombra que sempre espantava

o pássaro negro na tela branca

sou teu filho tanto como és

o bêbado oculto em cada canto da noite

sei hoje o que foste

sem nunca ter sabido quanto eras

choro-te agora na canção que não cantei

ou no verso que nunca escreverei 





24.5.2020

(Ilustração: Toni D'Agostinho)


23 de dez. de 2020

os velhos

 




os velhos sentam-se na praça

e jogam dominó

falam de coisas estranhas

como discos voadores e minhocas assassinas

riem com bocas sem dentes

envenenam o ar com seu hálito podre

os velhos sabem da vida

berreiros de recém-nascidos

e gemidos de moribundos

gestam flores murchas nas orelhas peludas

ouvem valsas ao som de sinos de igrejas barrocas

comungam velhas crenças de terras planas

cacarejam segredos de cada advogado

que olha por cima do ombro as pedras pretas

do dominó de pintas brancas como o olho

do gato que escorrega pelo capinzal

os velhos estranham as mídias

e se escondem atrás das lentes do lambe-lambe

qualquer passarinheiro que lhes entregue

uma pizza macia de queijo e azeitona preta

torna-se logo o conselheiro da tribo

os velhos não têm mais dentes e suas línguas

cortam o vento em lâminas de escândalos

sabem tudo os velhos da praça

por isso ordenham o sangue no olho

de jovens inúteis do passeio público

todos eles desejam que os velhos

dancem enfim o jogo da desesperança

mas os velhos da praça apenas gracejam

e riem de suas perplexidades e continuam

jogando dominó na velha praça dos velhos poetas 




25.1.2020

(Ilustração: Caravaggio)

19 de dez. de 2020

orgia





corpos penetram-se

interpenetram-se

fundem-se e separam-se

o tempo e o espaço

apertados e interligados

num só laço

num só abraço

do vento à água e à pedra

a tudo quanto medra

em conluio de penetrações

ossos e areia

o vento tateia

nas peles a terra e pulmões

orgânicos e minerais

as interpenetrações

sem interrupções

sem dores nem ais

o solo em que semeia

o ar que se respira

soterra o osso e a pele

põe e repõe e tira

e depois expele

e depois aspira

o fruto maduro

o pau que era duro

a polpa que é mole

derrete como água

à fonte que deságua

esfria e aquece

tudo que se mistura

interpenetrações

num só espaço

dento do nó do tempo

o tempo que morre

no corpo do morto

o osso e a pedra

da pedra à asa

da água à brasa

no fogo o jogo

o tempo passa

passa e repassa

a lua enlua-se e traça

a noite de gozos

de gozos não gozosos

de gozos gasosos

ao sol que aquece

à chuva que umedece

ao tempo que esquece

a terra se fertiliza

sem qualquer comoção

na orgia precisa

de corpos em gozos

em gozos de penetração

na orgia da decomposição



5.10.2020

(Ilustração: Claude Monet)


17 de dez. de 2020

onda

 






onda que vai

onda que vem

morte que vai

morte que vem

na rede balança

a morte que vai

a morte que vem

não sei se fica

não sei se vai

a morte balança

na rede que vai

na rede que vem

apenas o que sei

é que vou sofrer

a morte que vai

a morte que vem 




6.10.2020

(Ilustração: Arnold Böcklin (1827-1901)
 - a ilha dos mortos:terceira versão)

15 de dez. de 2020

obsessão

 






uma palavra apenas me basta

quando me acossam arroubos de tinta e letras

o cérebro alerta neurônios esquecidos

para acionar circuitos elétricos

a ligar frases e pensamentos

e os pensamentos voam em busca

em busca de conceitos e metáforas

sonhos sonhados ou sonhos vividos

como se a vida fosse apenas versos



pedras que são luas e luas que são flores

não importa a lógica

imprecisas as linhas de letras formadas

e só isso apenas

isso apenas o que me basta para viver



posso às vezes passar fome e frio

posso às vezes nem mesmo respirar

desencanto-me até de parcos prazeres

mas sem as palavras que nascem

de arroubos e de estranhas conexões

não passo



porque assim como nasce o sol

assim como brilham as estrelas

os neurônios de meu cérebro enlouquecem

e se desligam da vida e do sonho

se eu passar um só dia

sem escrever poesia





25.7.2020

(Ilustração: Lívio de Morais: Fernando Pessoa - heterônimos, 1997)

12 de dez. de 2020

o sentido da vida

 



a vida – a vida não tem sentido algum

a explosão de uma galáxia no universo

não passa de pequeno pum

de deuses mortos ou nunca inventados

e nós – os seres humanos – menos que o pó disperso

a buscar dentro de nós – os nós e os significados

de forças estranhas que nenhum ser domina



esta a vida – um raio de sol ou um brilho no olhar

esta a vida – a célula viva quase invisível no fundo do mar

esta a vida – só tem algum sentido

se você – ser que pensa ser racional – o procurar

com a certeza de que só viver é o que lhe basta

e mais – que só lhe baste o viver e o caminhar 





28.8.2020 

(Ilustração: Aleah Chapin - Seattle, Estados Unidos – 1986) 

10 de dez. de 2020

o relojoeiro

 






chuto a bunda da morte

e contemplo o vazio

que ficou no seu lugar



sei que não sou eterno

sei que profanei a realidade

e agora que vejo apenas o vazio

da não existência da indesejada

busco em mim algo inexistente

algo que preciso construir

- um relógio perfeito em suas engrenagens

para que a vida flua de novo como rio



não sou entre tantos atos complexos

necessários para tal tarefa

o relojoeiro de um deus que não há



o emergir de forças do vazio

só terá sentido se chamar de volta

a inevitabilidade de aceitar o não ser

e a esperança de voltar a viver

o que implica até mesmo morrer 




11.10.2020

(Ilustração: Salvador Dalí)

8 de dez. de 2020

o que sou eu

 



não sou branco 

não sou preto 

diz o ibge que sou pardo 

que porra de cor é pardo? 

branco sujo ou preto embranquecido com água sanitária? 

pardo pobre poeta da periferia da porra da vida 

isso sou eu? 

mistureba de etnias e de cores vira ausência de cor 

pelo menos para os sábios do instituto brasileiro de geografia e estatística 

geograficamente sou mineiro 

depois de ser brasileiro 

estatisticamente não sou nada – apenas mais um vira-latas 

seria melhor que esse instituto me chamasse de vira-latas 

pelo menos os vira-latas têm mais dignidade 

são reconhecidos – ali está um vira-lata legítimo – todos 

o apontam – seja um cão faminto ou um gato esperto 

vira-latas é um instituto brasileiro – está em todo lugar 

portanto senhores brancos e pretos 

portanto senhores índios e amarelos 

se não sou branco como vós 

se não sou preto como vós 

se não sou índio como vós 

nem amarelo como os orientais 

que me chamem de vira-latas 

mas pardo – porra! pardo é a puta que pariu! 

(que me perdoem as putas parideiras) 



17.11.2020


 (Ilustração: esculturas de Javier Marín)

5 de dez. de 2020

o estranho - 2

 






o estranho ser que em mim habita

não sei se sou eu mesmo do avesso

ou se ele apenas de vez em quando me visita

para me fazer dar piruetas como um menino travesso

um palhaço de circo ou circunspecto professor

pesadelo de meus dias de mau humor

ou apenas a sombra de passos na noite escura

quando a esperança que percorre minhas veias

sobe morros de minas e ruas tortas à procura

de sonhos que há muito se desfizeram nas areias

de um tempo de solidão que em meu peito perdura 





21.7.2020

(Ilustração: Eric Lacombe - dark abstract portraits)

4 de dez. de 2020

nova ideologia

 





stalin plantou uma árvore

cujos frutos estavam podres

regamos sim essa árvore

por um tempo demasiado

porque não víamos seus frutos podres

ofuscados pelo sol da ideologia

não foi a ideologia que frutificara

fora o coração podre de stalin

que fizera nascer essa árvore

de frutos podres

o sol cegara com ideologia

os nossos olhos

não plantou nenhuma árvore

no coração de marx

os pobres do mundo continuam

comendo as raízes do capitalismo

sem noção do fruto dourado

que é mais podre que os frutos podres da árvore de stalin

os campos de soja destroem florestas

porque dizem que tu precisas comer

e o gado come o ouro de wal street

porque dizem que tu precisas viver

nós os ex-stalinistas cagamos solenemente

nos salões de governos dos ditadores

se confessamos os crimes que não cometemos

é porque deixamos nossos fígados dependurados

nos paus-de-arara dos quepes verdes

porque não batíamos continência para beócios

não há saída para o pensamento

que não seja o raio de luar em noites negras

há nos palácios de todos os governos

quartos escuros e escuras intenções

não nos cabe a nós

- os ideólogos da nova terra –

exorcizar demônios que não criamos

- aliás aqui entre nós

nunca acreditamos nos demônios –

também não acreditamos nos deuses

e se queimamos os seus altares

é porque a vida vale ser vivida e não querelada

seja o espanto de cada um de nós a nossa estrada

seja o vento de cada mudança o nosso norte

somos todos uns loucos da lua cheia

a esconder nos esconsos das galeras dos piratas

o tesouro de nosso desespero

no histerismo freudiano de nossos sonhos

determinismos explodem a cada passo

sabemos o que queremos

nem sempre queremos o que sabemos

no chão podre de fábricas de computadores

há mais pedras lapidadas no passado

do que imaginou qualquer poeta

se gritamos o nosso urro pelas ruas

somos apenas pó de estrela

à procura de um destino

que se sacrifiquem novos cristos

não deveria ser problema nosso

mas o grito do passado ainda ecoa

chega de sangue

chega de pregos

chega de gólgotas

a esperança está no capim da estrada

não está na sandália do abandonado

não há pai

não há mãe

os filhos da pátria são todos filhos gerados in vitro

ou clonados do sangue dos conquistadores

césares e alexandres pululam pelos campos

em busca de nossa jugular

enquanto ainda hitler gargalha entre os vermes

o vento da dor a todos arrepia

ou você luta ou você caga

se o caminho de flores nascer sobre as fezes

e sobre o sangue de quem aceitou a lei do chicote

a lei deles escurecerá o mundo

caiba a cada novo membro da nova seita

ser o sol que esturrique o verme

no coração de stalin não há mais sangue

que no coração dos plantadores de cadáveres

enquanto berra o cordeiro de deus

bebem teu sangue os magnatas da quinta avenida

e de todas as quintas partes de tua vida

que eles expropriam enquanto és o escravo do mercado

sobre os teus ossos o mar em ondas

renasce em flores de pedra e gelo

e desse cabedal és tu o chão em que pisam

não terás nunca em tuas mãos o teu próprio destino

se o entregas aos cães que ladram na noite

e buscam tuas carnes ou cheiram tuas entranhas

teus desertos mentais deixam aos monstros

os restos de orgias dolarizadas em bolsas do mundo inteiro

o papel picado que eles jogam pelas janelas

nas festas de réveillon são as tuas tripas

e cada célula do teu corpo tem dono

formas as fileiras sob as botas que batem

no asfalto do poder a marcha dos famintos

não é tua fome que alimenta o monstro

não é teu grito de dor que provoca orgasmos

a máquina que move o mundo

tem no teu olhar para o futuro

a energia de sóis e de bombas atômicas

para manter teu espanto

e comer a cada dia um pouco do teu sonho

e é de teu sonho que ela – a máquina –

se alimenta e se constrói

esquece stalin – ele está morto há tantos milênios

quanto o teu silêncio diante do destino que traçam para ti 




25.5.2020 

(Ilustração: escultura de Kris Kuski)

 

2 de dez. de 2020

nosso verão

 



 



fez-se mar o que era rio

fez-se tempestade o que era chuvisco

uns olhos claros ao vento frio

e as ovelhas fugiram de seu aprisco



no mar de emoções a tempestade

entre balidos de angústia uma verdade

tesouros antigos em mapas desenhados

por mãos assassinas de velhos piratas

continham os prêmios mais desejados

vertidos em mares de ouros e de pratas



fez-se oceano o que era rio

e as tempestades todas de nosso verão

fizeram soçobrar o meu navio

nos teus mares de orgasmo e emoção 





5.5.2020

(Ilustração: Alyssa Monks)

30 de nov. de 2020

nossa vida

 



para a.g. 



talvez um sonho talvez um rio

talvez o vento a levar a folha caída

talvez o nosso desdém ao desespero

talvez a vida apenas

talvez a vida nunca vivida como pesadelo

seja como for

não há mais presença

não há mais ausência

não há mais encontros nem desencantos

em nosso olhar 


viver é agora para nós

apenas um cuidar

você de mim

eu de você

porque o rio que passou sob nossos pés

tem caudal e tem naufrágios demais

para que pensemos que a nossa canoa

não seja a essa altura uma só canoa 




12.6.2020

(Ilustração: Ada Breedveld)




28 de nov. de 2020

nos braços da atriz pornô

 





adormeci num redemoinho de lembranças

para o sono de chumbo da lua minguante

acordei na manhã de água e ágata

nos braços da atriz pornô

menino travesso a molhar lençóis

no abismo de líquens e águas-vivas



mescla de santa e messalina

a loura enlanguescia a meus espasmos

olhos agudos e penas tenazes

e de repente negra em valquíria tornada

cabelos eriçados na cavalgada



no susto de meus próprios desejos

perdidos nas sombras fugazes

de tragédias ainda não consumadas

despenco nos mares de seus orgasmos



- não eram mais sonhos de menino assustado

eram espantalhos de um caminho já trilhado







37.11.2020 

(Ilustração: escultura de Franz Xaver Bergman/Bergmann -1861–1936)

26 de nov. de 2020

noites perdidas

 





talvez eu queira o silêncio

das noites perdidas

o estranho silêncio

dos seres mortos

a estrada enlutada pela ausência da lua

as pedras do caminho espetadas de espinhos

o desencanto de gozos em camas de gelo



talvez eu queira

a beira do abismo

para gritar o meu grito sem voz



e chorar dentro de mim o espanto

de buscar a vida e achar no entanto

só as notas desafinadas do meu canto




10.6.2020

(Ilustração: Eric Lacombe - dark abstract portraits)

24 de nov. de 2020

noite perdida

 

 




numa noite perdida nas montanhas de minas

quero amar você à luz de uma lua azul



que sirva de leito a relva molhada de orvalho

que nos cubra o vago brilho das três marias



nessa noite de sortilégios e de beijos raros

você também amará as estrelas e meus abraços



no meio da noite partiremos rumo aos anseios

que deixamos adormecidos ao longo do tempo

de tanto tempo que nem mais nos lembramos

do cheiro de nossos corpos à luz da lua azul



só isso mesmo o que restou de mim em ti

e só isso mesmo restou de ti em mim

- eflúvios levados ao vento e pelo vento



lembranças de uma noite que não houve

de uma lua que nunca existiu - dois corpos

alquebrados pelas arestas do tempo e das noites

que passamos apenas pensando numa lua azul





28.10.2020 

(Ilustração: foto de Fátima Alves)

22 de nov. de 2020

noite de saudade

 




esta noite eu tive uma noite de vagalume

dormia

acordava

dormia

acordava

quando dormia sonhava

sonhava com você

quando acordava pensava

pensava em você

não sei se foi prazer ou tormento

pensar tanto em você

sonhar tanto com você

meu amor de noites de saudade e isolamento 




30.5.2020

(Ilustração: Eric Lacombe - dark abstract portraits) 


20 de nov. de 2020

noite calma de inverno

 




uma noite calma de inverno

penada a alma ao açoite do vento

vaga assombrada por alamedas

de cheiros e perfumes incandescentes



e o lento e compassado passo

de cavalos atrelados a coches fantasmas

em meio a miasmas de pântanos podres

marca a batida apressada do meu peito



no silêncio pesado de meus pesadelos

numa noite calma de inverno

o vento atropela meu sentimento de abandono

perdido o sono ao lento passo de abantesmas



sorriem em mim os lábios da morta

que agora agarra minhas pupilas

sou seu senhor e seu escravizado cavalo

atrelado a seu destino e a seu lento passo



destroçado o sono e ao sonho arrebatado

pelo doce e terno abraço

da alma penada que me deseja sorte

e sorri o sorriso da minha morte 





27.7.2020 

(Ilustração: Francisco de Goya)

18 de nov. de 2020

noite branca

 





madrugada três horas e três minutos

a cidade dorme o poeta escreve

escreve sobre o fantasma que flutua

pelo quarto branco ao som das harpas

o fantasma que aperta o peito do poeta

e leva-o para o reino das amarras perdidas

onde o vento debrua de cores o horizonte

fazendo nascer manhãs de asas partidas

manhãs que não voam pelas janelas fechadas



madrugada três horas e quinze minutos

a cidade é folha caída não levada pelo vento

sem estrelas o céu e sem luas o quarto branco

o poeta finge saudades de tempos não vividos

levado pelas asas frágeis da torpe insônia

deixa doer o peito e dome de olhos abertos

sopra o vento penas de aves de rapina

flutua o fantasma ao som das harpas

fechada aos sonhos e esperanças a noite branca 




30.6.2020

(Ilustração> Bazille - L'Ambulance improvisée, 1865)

16 de nov. de 2020

no silêncio dos meus olhos

 





despe-te silenciosamente

deixa que as chamas de teus seios

inflamem olhos alheios



despe-te sem resistências nem relutâncias

deixa que teu ventre se abra

aos beijos notívagos

despe-te sem quaisquer receios

e deixa que te comam assim

ninfa ou deusa dos mares nascida

cansada hetaira de noites insones

ou apenas santa exposta aos sacrifícios

da comunhão de bênçãos e silícios



abre do teu corpo todas as fronteiras

deságua dos teus olhos todas as complacências

entrega teus desejos aos que te desejam

sê puta na cama redonda sob luzes roxas

sê santa arrependida nos orgasmos de beijos gregos

sê tu mesma em todos os espasmos

que os mares revoltos de teus olhos provoquem



silencia o pio da coruja no bailado dos teus passos

e vem pela noite em asas de cetim

para morrer em meus braços e renascer

deusa eterna a despir-se só para mim

no silêncio das estrelas dos meus olhos 





8.7.2020

(Ilustração: Armand Rassenfosse (1862-1934), 
Illustration pour La Femme et le Pantin de Pierre Louÿs - 1898)


14 de nov. de 2020

nirvana

 







entrelaçam-se os dedos

entrelaçam-se os braços

entrelaçam-se as pernas

somos uma escultura de maria martins

e tu me sugas para dentro de ti

sou agora apenas o perfume do teu perfume

no nirvana de tuas entranhas

sem que haja ventos ou chuvas que rompam

os laços entrelaçados de nosso gozo 





25.7.2020

(Ilustração: escultura de Maria Martins)


12 de nov. de 2020

Mundo da poesia

 






Às vezes penso

que me alieno cada vez mais no mundo da poesia.



Então, caio em mim

e percebo que é ela – a poesia –

a única ponte que me une ao mundo real. 





31.10.2020

(Ilustração: John William Waterhouse - Ophelia)



10 de nov. de 2020

morri em 1964

 






no meio do povo

no meio da bala

você não viveu em 1964

o tiro não saía pela culatra

o pau não cantava só na arara

a bota não pisava só na cara

o esporro no negro

o pau no estudante

o capuz no prisioneiro

a viagem para lugar nenhum

você não viveu 1964

no pátio ou no quarto

o quartel dava o número

que podia ser qualquer um

e o sol era às vezes tão quadrado

que a porrada vinha de qualquer lado

você não viveu 1964

porque eu que devia ser seu pai

eu morri em 1964



7.6.2020

(Ilustração: tanques diante do Congresso Nacional 
durante o golpe de 1964; foto de autoria não identificada)