28 de out. de 2015

CIDADES DE MINHA INFÂNCIA




 (Lavras/MG: praça dr Jorge, década de 60)





Resgato da memória um poema perdido


para tentar lembrar os dias passados:


cidades da minha infância,


nomes estranhos na poeira da memória


- Lavras, Três Pontas, Três Corações.


Rios que as banharam


continuam não os mesmos


dos tempos idos


e vividos.


Os passos descalços do menino de rua


perderam-se no asfalto da grande cidade.


Os ecos dos cantos de seus pássaros


são hoje cantigas que não relembro.


O cheiro do mato, seus morros tão verdes


são o tesouro escondido no fundo da dor.


Saudade!


As casas baixas de janelas para a rua,


os becos escondidos, os frutos proibidos,


fundem-se todos em massa disforme.


Nem a saudade que sinto é a mesma saudade


dos tempos em que ainda me permitia


cantar os loucos suspiros


ao luar.


E enquanto escrevo (preso às palavras),


como dói este poema inútil!


Como dói no fundo de meu ser!


Antes deixara perdidas na bruma


as cidades amigas/amargas


de dias felizes que não revisitarei.


Cidades de minha infância,


acordaram suas lembranças


ao poeta que sonhava


ou sobrevivia


ao pesadelo sempre igual dos dias cinza.


O poeta que, de tanto levar porrada na vida,


já se sentia liberto


de uma infância talvez não vivida.


E assim, de repente, surge funda uma saudade.


E assim, de repente, emergem das brumas,


ruas, becos, vales e montes


perdidos como perdida uma vida,


doendo fundo nas veias,


resgatando sonhos e esperanças.


E as sensações sentidas,


mais do que as vividas,


antes presas, amordaçadas,


rompem diques


e arrastam a memória cansada


por caminhos esquecidos.


E a realidade que explode à volta


faz-se grão e pó e nada.


Fantasmas,


loucos dias de um remoto tempo,


pássaros negros num fundo azul,


riachos podres em vales perdidos,


tudo o que um dia julgara sepulto,


vive, revive, revolta


o momento eterno da dor.


Cidades da minha infância,


não são nem um retrato na parede.


São apenas a dor esquecida


e um dia lembrada


em momentos de loucura e depressão.


E qualquer som, imagem ou perfume


que as tragam de volta


são apenas sensações da memória.






S.P. 16.3.83



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