UM PONTO NOVE
Talvez haja luar sobre o jardim
e
uma face negra sob a face branca
e
uma face azul sob a face negra
e
um arco-íris ao fim das máscaras
talvez
haja apenas minha mente
a
criar fantasmas e sombras sob a luz
a
luz única de estranhos olhos
a
ver apenas o luar plausível
nas
brancas flores do jardim inútil
só
porque talvez floresça a vida
sob
o luar do jardim de outrora
e
fantasmas a haver no fundo do meu ser.
DOIS PONTO NOVE
Dos deuses que em mim habitam
guardo
apenas a ironia do riso fácil
a
tornar inferno a vida fútil
a
tornar em dor a saudade inconsútil
dos
deuses que em mim resguardam
habituo-me
a ter somente o olhar ardente
a
domar os ventos de minha louca mente
a
soprar a dor que em dor ressente
dos
deuses que em mim ressoam
ouço
os lamentos como do inferno
a
queimar o amor em fogo eterno
a
tornar mais fútil o olhar mais terno
os
deuses que em mim se rasgam
abrem
brechas no meu ser inútil
tornam
gelo o ser que sente
queimam
em sarça o corpo externo
para
deixar bem claro que em mim habitam.
TRÊS PONTO NOVE
Em noites vagas de tempos longos
quando
em luz a lua agoura
sonhos
vivos de além aurora
o
vento vem ao dia lento
soprar
em mim o deus de outrora
e
esse deus em luz tornado
para
um instante para ver atrás
os
sonhos loucos de luz e glória
a
queimar em sangue à noite vaga.
QUATRO PONTO NOVE
Vagas noites de outrora inverno
vagas
sombras de meus fantasmas
na
rua estreita o bonde passa
e
enche a noite de vozes vãs
em
cismas de etéreas glórias
em
vão desfilam meus caros sonhos
à
luz da lua o bonde vem
marca
em fogo o velho trilho
e
arrasta em dor a dor que sobreviverá.
CINCO PONTO NOVE
Soube em ti desnudar o vento
minha
alma triste em canto oblongo
a
seguir a festa do deus já morto
a
bater matraca à luz da lua
das
pedras se levanta o pó
da
fé perdida em noite azul
e
o pobre menino inútil
revela
a alma na chama nua.
SEIS PONTO NOVE
Leve o passo a sondar auroras
passa
em poças o pé descalço
vinte
o número em mágica posse
a
vida além do morro desce
a
encher de luz o passo firme
nada
avisa o pé da pedra
a
haver um dia à lua morta
atrás
da sombra o vulto inútil.
SETE PONTO NOVE
Água corrente o corpo molha
vida
corrente a alma espanta
do
rio nasce o peixe inútil
ao
pescador que anzol não leva
leva
apenas da reza fútil
a
voz eterna da água suja
em
que um dia o deus deixou
que
ao corpo nu um outro espanto
vazasse
em medo a dor de amor.
OITO PONTO NOVE
Folgo em ver-te à luz de ti
ó
lua fraca em noite vesga
o
frio em ti a saudade gela
de
outrora o rijo passo a ver aurora
em
noites lentas de reza e dor
folgo
em ver-te, ó luar inconsútil,
a
descer teu manto à rua torta
em
que deixei a caminhar perdido
outrora
o sonho de um deus feliz.
NOVE NOVENA. PONTO.
Talvez não haja luar sobre o jardim
talvez
talvez
não venha nunca sobre mim
o
deus perdido em risos loucos
a
lua apenas à noite a noite estranha
a
lua apenas o meu sonho banha
ao
verso esparso escolhe assim
o
lamento apenas de um deus maroto
a
zombar do alto o meu espanto
a
dor de outrora era futuro
a
dor de hoje é a face oculta
pela
falsa lua a tecer mistérios
em
jardins de luz que haverá outrora.
Nunca
talvez agora.
(Ilustrações: Emil Nolde)
24.5.94
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