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traduzo sylvia e piro
quero escrever assim quando crescer
mas não quero sofrer assim quando viver
salto no tempo da memória
para achar que deus é hospital
tão louca a vida e era ela a louca
maura lopes cançado
salto no tempo de outrora
para buscar meus encantamentos
e encontro apenas acasos
a flor murcha do mandacaru depois da chuva
por que lembrar o que não quero?
por que escrever apenas o que dita a razão?
por que seguir fantasmas e almas mortas?
por que fazer perguntas que já têm respostas?
lá em washington obama adoça seu café
com duas colheres de açúcar de cuba
acende um charuto presente de fidel
e diz que o mundo ficou melhor
142 crianças - talvez mais, muitas mais -
que estudavam numa escola do afeganistão
são recebidas pelas virgens do alcorão
no céu encomendado pelo talibã
agora ouço que uma criança acabou de morrer
em belo horizonte trancada ao sol dentro do carro
e o papa afirmou que cachorro tem alma e vai para o céu
as crianças do talibã ficaram ainda mais felizes
o mundo gira e meu cérebro repuxa de dor
não quero encontrar a sylvia nem a maura
quero gritar o meu quase desespero
sem precisar derramar lágrimas
salto de novo no tempo da história
e olho meus companheiros de outrora
os que sobreviveram e o outros tantos que morreram
e não há o que fazer quanto a isso
se ainda tenho estrada à frente
tomo consciência de que o caminho está mais lento
e em breve acaba - preciso calcular cada passo
e devo evitar as pedras e os espinhos
fugiram-se-me os encantos do recomeço
ficaram os encargos das pílulas e dos colírios
se abraço à noite meu travesseiro
é para evitar pesadelos e mau despertar
traduzo poetas que arrostaram o medo
e reviraram as vísceras
tenho deles apenas o estranhamento
de tentar viver o tempo que ainda me pertence
s.p./20 de dezembro de
2014.
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